Ninguém pode alegar que um filme de espionagem não desperte algum interesse. Essas histórias incitam, no mínimo, a curiosidade do público, que se transforma rapidamente em uma necessidade de descobrir se os eventos ocorreram exatamente como mostrados ou se a ficção teve um papel maior do que o necessário. Independentemente da abordagem do diretor, sempre há um desejo de conhecer melhor os bastidores: se os atores se assemelhavam aos personagens, se não houve inclinações ideológicas, as motivações do cineasta ao escolher o tema, e as semelhanças e diferenças entre os intérpretes e os papéis. Essas questões são previsíveis e compreensíveis, confirmadas pela busca incessante na internet após o lançamento de um filme. Cada estreia traz consigo um interesse renovado pela história abordada, seja ele positivo ou negativo. É preferível ser alvo de críticas do que cair no esquecimento.
O motivo pelo qual Ashraf Marwan (1944-2007) se tornou um espião egípcio para o Mossad, o serviço secreto israelense, é incerto, mas “O Anjo do Mossad” (2018) oferece algumas teorias controversas. O diretor israelense Ariel Vromen se empenha em explorar a complexa psique de Marwan, sempre cercado por figuras que sabia enfrentar em algum momento, ainda que incerto de como isso ocorreria. Casado com Mona, uma das cinco filhas do presidente do Egito, Gamal Abdel Nasser (1918-1970), Marwan, interpretado por Marwan Kenzari, se aproxima mais de Anwar Sadat, sucessor de Nasser. Vromen aborda com habilidade a distância entre Marwan e seu influente sogro, deixando claras as razões pelas quais Marwan, um empresário de sucesso no Cairo dos anos 1970, se afastou da família, que inicialmente o repudiou, e se aliou aos opositores de Nasser, incluindo Sadat e, posteriormente, o governo israelense. A controvérsia sobre se Marwan realmente desejava ser um informante de Israel ou se, tomado por medo e arrependimento, tentou enganar um dos serviços de inteligência mais eficazes do mundo persiste até hoje.
O conflito entre Marwan e Nasser abre inúmeras possibilidades no roteiro de David Arata, mas Vromen mantém o equilíbrio entre a exploração da carência emocional do protagonista — evidenciada pela atuação contida e precisa de Kenzari, que revela o drama na intensidade certa — e os complexos desdobramentos políticos do Oriente Médio. Nesse contexto, surge a possibilidade de um pedido de ajuda do Egito aos Estados Unidos, em detrimento da União Soviética, cujo colapso Marwan considerava iminente. Nasser, interpretado por Waleed Zuaiter, rejeita essa ideia e humilha Marwan diante do ministério. Em privado, mas audível, o presidente expressa seu descontentamento com a escolha de Mona, vivida por Maisa Abd Elhadi, para marido. Após a morte de Nasser, Sadat, interpretado por Sasson Gabai, assume o poder, e Marwan rapidamente se esforça para conquistar a confiança do novo líder, delatando funcionários corruptos e investigando suspeitos, revelando uma mistura de zelo e paranoia. Marwan, conhecido como “o Anjo”, começa então a atuar como agente do Mossad no Egito.
Embora algumas pontas soltas permaneçam, como o peculiar casamento de Marwan e Mona, que nunca adotou o sobrenome do marido, o filme oferece uma narrativa envolvente, com suspense entrelaçado ao pano de fundo histórico, capaz de prender a atenção apesar da complexidade técnica. Ariel Vromen ajusta a tensão conforme a parte da trama que deseja explorar, situando a história com facilidade entre Londres e o Cairo de cinquenta anos atrás. Marwan Kenzari, um ator em constante evolução, capta a ambiguidade e a instabilidade que marcaram a vida e a morte de seu personagem — falecido após uma suspeita queda da sacada de seu apartamento em Londres —, uma das figuras mais enigmáticas da história daquela região. “O Anjo do Mossad”, sem grandes pretensões, oferece pistas significativas sobre esse intrigante episódio histórico.
Filme: O Anjo do Mossad
Direção: Ariel Vromen
Ano: 2018
Gêneros: Espionagem/Thriller/Ação
Nota: 9/10