O assassinato que (quase) abalou a ditadura

O assassinato que (quase) abalou a ditadura

Com uma diferença de pouco mais de uma década, passei pelos mesmos bancos que Ana Lídia Braga, sequestrada em 11 de setembro de 1973, aos sete anos, na saída do Colégio Madre Carmen Sallés, na 604 Norte, em Brasília. Henrique Braga, irmão mais velho da menina, foi apontado como o principal suspeito. Braga era amigo de Alfredo Buzaid Júnior, filho do ministro da Justiça Alfredo Buzaid (1914-1991), e Eduardo Ribeiro de Rezende, o Rezendinho, cujo pai era o senador Eurico Rezende (1918-1997), e os três eram chegados às famosas roconhas, as festas em que rock e maconha se fundiam num carrossel diabólico em que tudo era permitido.

Braga tinha uma dívida com Raimundo Lacerda Duque, o traficante que fiava-lhe a erva e que, segundo os investigadores, teria levado a menina na intenção de seu pagamento e mais dois milhões de cruzeiros, o equivalente a 250 mil reais hoje. O corpo de Ana Lídia foi encontrado no dia seguinte, com indícios de asfixia e violência sexual. Henrique Braga e Raimundo Lacerda Duque chegaram a ser presos, mas acabaram soltos por falta de provas. Alfredo Buzaid Júnior morreu em 1975, em um acidente de carro; em 1990, Rezendinho se matou, aos quarenta anos. Comorbidades ligadas ao alcoolismo também selaram o destino de Duque, aos 62 anos, em 2005. O irmão de Ana Lídia é médico no Rio de Janeiro. A ditadura só acabou em 15 de março de 1985, o ano em que me tornei aluno do Carmen Sallés.