A cadeira de Nélida Piñon

A cadeira de Nélida Piñon

Pelo histórico da Academia Brasileira de Letras, pressupõe-se que, após a partida em direção ao Monte Olimpo dos Escritores da já saudosa ficcionista Nélida Piñon, a cadeira 30, ocupada pela insigne humanista a partir da eleição de 27 de julho de 1989, se destine a uma candidata do sexo feminino do porte intelectual da autora do clássico “A República dos Sonhos” (1986). Neste contexto, a meu ver, três concorrentes de expressão estão habilitadas ao postulado de imortalidade acadêmica — a historiadora Mary Del Priore; a escritora Conceição Evaristo; e a Profa. dra. Heloísa Buarque de Hollanda.

Não obstante, caso os acadêmicos não se pautem pela coerência de substituição da ordem de gênero, outros representantes do seguimento masculinos estarão aptos ao processo democrático do Supremo Tribunal Eleitoral da ABL, tais como: o advogado, jornalista e musicólogo Ricardo Cravo Albin; o crítico literário Silviano Santiago; e o romancista Milton Hatoum. Pela trajetória indefectível, meritória e ilibada em defesa do patrimônio popular pátrio, haja vista a sua imprescindível gestão ao convés e leme do Museu da Imagem do Som (MIS), além da assinatura do Dicionário de Música Popular, por justiça ainda que tardia o lugar vago da cadeira de Nélida Piñon deverá ser ocupado por Ricardo Cravo Albin, o Embaixador da Música Popular Brasileira.

Logo a seguir, a segunda opção de ingresso à Casa de Machado de Assis, caso desempacasse de sua introspecção congênita à Carlos Drummond de Andrade, por merecimento devido aos serviços prestados ao espólio literário pátrio, seria válida a candidatura ao pleito do discretíssimo Silviano Santiago, ensaísta literário de fina estirpe e autor de “Em Liberdade”, biografia imaginária de Graciliano Ramos. Em terceiro plano, salvo engano, o mais credenciado a figurar entre os imortais haveria de ser o amazonense Milton Hatoum, autor da obra mais importante do século 21 — Dois irmãos, livro magnífico de (re)fundação da análise psicológica, em diálogo com a pós-modernidade.

Da geração de Hatoum, eu ainda indicaria o professor e escritor Deonísio da Silva, autor da obra-prima “Avante Soldados; Para Trás”, vencedor do Prêmio Casa de Las Américas, com júri presidido por José Saramago. Entretanto, o escritor catarinense, membro da Academia das Ciências de Lisboa, em entrevista ao programa Literatices (YouTube), declarou à própria Nélida Piñon, a sua convicção em não integrar o seleto clã de autores, intelectuais, artistas, políticos e afins.

No instante subsequente, penso também no emblemático Paulo Lins, como indicação ao prélio acadêmico, pois que creio eu que esteja o responsável pela criação do homérico “Cidade de Deus”, à altura do panteão de frequência do Petit Trianon, por seu genuíno talento literário, no âmbito da inovação narrativa originária da periferia. Considero o neonaturalista Paulo Lins uma espécie de Jorge Amado contemporâneo, sobretudo pelo ritmo da narração forjado pelo vigor de uma coloquialida magistral, que, à primeira vista, captura o(a) Leitor(a) em sua teia de intrigas repleta de impropérios e ações deflagradas pelo instinto humano.

Enfim, ainda que consideremos que Nélida Piñon seja uma feminista convicta e inveterada, a impressão que fica no ar é que a tendência do eleitorado acadêmico é se decidir pela eleição do laborioso Ricardo Cravo Albin, que, há décadas, aguarda, pacientemente, o seu ingresso ao convívio cordial e afetuoso dos membros da Academia Brasileira de Letras. Por esta razão, certa feita dirige-me ao presidente Merval Pereira, com o intuito de ressaltar toda a expectativa da intelectualidade pátria, que catalogar-se-á pela fidúcia de que a imprescindível eleição do ilustre pesquisador Cravo Albin se coaduna com o reconhecimento de sua militância intelectual, em incansável defesa do patrimônio musical brasileiro, por seis décadas ávidas por lhe inscrever nos torrões da imortalidade.