Os 50 anos de Transa, de Caetano Veloso Foto / Joa Souza

Os 50 anos de Transa, de Caetano Veloso

Certa vez, minha filha Carolina me perguntou o motivo do Caetano Veloso, depois de tanto tempo, continuar a falar de seu exílio forçado entre 1969 e 1972. Eu respondi que seria a maneira dele nos dizer que não devemos aceitar tempos tão sombrios novamente.

Foi no seu período de exílio em Londres que Caetano gravou “Transa”, um dos álbuns mais importantes de sua carreira e que foi lançado em 1972 quando o músico já estava definitivamente de volta ao Brasil. Passados 50 anos, o disco continua a nos maravilhar e a soar sempre atemporal.

Permeado pelas saudades de Caetano da sua terra natal, incorpora as tendências musicais da capital inglesa, como o rock e o reggae, com a poesia e os ritmos brasileiros, principalmente os nordestinos. O resultado é uma obra, que apesar de tantas colagens e misturas, tem uma coesão impressionante.

Transa foi produzido pelo britânico Ralph Mace que, focado em questões técnicas de gravação, deixou total liberdade para Caetano e Jards Macalé cuidarem do repertório e da direção musical. Além de Macalé, participaram do álbum os músicos Tutty Moreno, Áureo de Souza, Moacyr Albuquerque. A voz de Gal Costa é ouvida em três das faixas e Angela Ro Ro toca gaita em “Nostalgia”.

Ao todo são sete canções compostas por Caetano Veloso, com exceção de “Mora na Filosofia” (Monsueto, Arnaldo Passos) e “Triste Bahia”, versos de Gregório de Matos musicados por Caetano.

As músicas são cantadas em português e inglês. Em alguns pontos, Caetano interpola trechos de outras canções, como no rock tropicalista “You Don’t Known Me”, no qual Gal entoa versos de “Maria Moita” de Carlos Lyra e Vinicius de Moraes.

As misturas, ou colagens, têm seu ponto alto na faixa “It’s a Long Way” que já no título nos remete a “The Long and Widing Road” dos Beatles e continua com trechos de “Sodade, Meu Bem, Sodade” de Zé do Norte, “A Lenda do Abaeté” de Dorival Caymmi, “Água com Areia” de Jair Amorim e Jacobina, “Consolação” de Baden Powell e Vinícius de Moraes.

Provavelmente um dos primeiros contatos do público brasileiro com o reggae tenha sido pela canção “Nine Out of Ten”, que Caetano já disse ser sua melhor música cantada em inglês.

“Transa” foi inovador e revolucionário, não só na sua sonoridade, mas também na sua capa. Chamada “Discobjeto”, ela se transformava num sólido tridimensional de seção triangular.

Melhor do que ler sobre uma obra musical é ouvi-la. E “Transa” é um álbum que deve ser ouvido como um todo, do começo ao fim, para que possamos apreciá-lo de forma plena.