O palco de Narciso: quem é você nas redes sociais?

O palco de Narciso: quem é você nas redes sociais?

Usuários de redes sociais sabem de uma coisa: conseguir chamar atenção continua tão difícil como antes do advento delas. Ou até mais. Isso é um paradoxo, visto que a ferramenta para aparecer está em nossas mãos: o celular. É uma novidade revolucionária; pelo menos teoricamente derrubaram-se os intermediários e, agora, só depende de você. De posse de um aparelho, conecte-se à internet e crie uma página no Facebook, Instagram, Tik Tok, Youtube ou qualquer outra rede: pronto, você acabou de integrar o maior fluxo de pessoas e empresas do Universo conhecido. Se seu objetivo é fazer negócios, você eliminou o aluguel de uma sala, água, energia e funcionários.

Mas isso não basta, como também não basta manter uma rotina e carregar sua página de maneira sistemática, todo dia. Você pode ter entrado no jogo e não estar jogando. E mais: são bilhões de jogadores iguais a você querendo aparecer. Milhões já participam do jogo, inclusive em seu ramo de atividade.

É lógico que, se somos bilhões de usuários, estar integrado a essa grande comunidade virtual (nosso móvel pode ser necessidade comercial ou simples hedonismo) não significa por si grande coisa. Você vai continuar invisível se não suprir certas condições básicas que as redes sociais impõem. Elas são empresas cujo faturamento advém justamente do capital que você investir para catapultarem o seu próprio negócio (o gigantismo delas não é casual). Para que tenha algum êxito nesse grande Palco de Narciso são necessárias várias coisas, mas é provável que três sejam primordiais: 1) o tempo de exposição, 2) a qualidade do seu produto e 3) a amplitude de seu público. O chamado “impulsionamento” pode resolver o último item, podendo projetá-lo de algumas dezenas de seguidores vegetativos para centenas e milhares. Criar um perfil nas redes sociais é de graça. Mas aparecer tem um preço que nem todo iniciante tem condições de custear, e neste aspecto a similaridade com o mercado tradicional é gritante: não adianta abrir uma porta e não se promover.

Portanto, o desafio de equacionar aquelas três condições é o mesmo, apesar de agora você ter uma “sala” de graça. Também não basta contratar um gestor de redes sociais porque a tarefa não se resume a fazer impulsionamentos. Esta é, digamos, a mãozinha que as redes e profissionais “exteriores” te dão. Só que, além de ampliar o seu público consumidor, existe na “prateleira” muita qualidade na proporção inversa de tempo, escasso, que lhe é concedido para ser visto numa postagem: uma fração de segundos, por vez. Se exagerar na informação, ninguém nem se dá o trabalho de curtir um nome ou marca desconhecidos. Para isso o internauta teria de parar alguns segundos, e você não é Bruna Marquezine nem Felipe Neto para despertar interesse espontâneo. Não sendo uma celebridade será muito difícil alguém lhe dar atenção, e se você for visto será muito difícil alguém achar que é bom o bastante naquilo que faz. Já isto ocorre porque há uma saturação de coisas bem-feitas, e até mesmo uma quantidade exponencial de coisas excepcionais que te tornam, virtualmente, apenas “bom” ou até ignorável, entre os concorrentes. Os termos de comparação explodiram, e não espere muito de seu score nesse meio.

Compreender a cultura contemporânea é impossível sem entender o fenômeno revolucionário das redes sociais. Você deseja e até precisa fazer parte delas, pois virou negócio, parte talvez mais decisiva da economia contemporânea. Tornaram-se ganha pão. Antigamente você saia de casa e usava as pernas, para isso. Agora, toda a operação do consumidor pode se resumir num gesto único e elementar: correr a tela do celular com os dedos — os mesmos dedos que separaram o homo sapiens dos outros primatas, em algum momento da evolução. É um gesto simples, mas viciante, obsessivo, quase automático. O olho se encarrega de selecionar o que o atrai. O cérebro faz as duas operações (mover e ver) muito rapidamente, naquela fração de segundos que é a janela por onde você espera que o consumidor o enxergue e, se possível, se detenha. Como numa paisagem vista das janelas de um trem.

É nesse carrossel sem fim que você tenta aparecer, aos socos e pontapés, em meio a bilhões de usuários em tempo real, recarregando o tempo todo, o tempo todo, sem nunca parar. O fluxo de postagens manifesta-se como enxame de abelhas, dificultando qualquer tentativa sua de ser visto. Portanto, não se iluda: é fácil entender por que a maioria da humanidade continua do mesmo tamanho de sempre — apesar de também integrar e interagir nas redes sociais.