3 anos depois, a temporada mais esperada da história da Netflix acaba de estrear Divulgação / Netflix

3 anos depois, a temporada mais esperada da história da Netflix acaba de estrear

A sensação de que forças invisíveis rondam os limites do real cria o cenário perfeito para as narrativas sobre a chegada dos extraterrestres e as teorias conspiratórias que soem prosperar depois que se desbrava essa perigosa senda. Impotente, o cidadão comum é só uma peça descartável num tabuleiro submetido a mãos tão hábeis quanto truculentas. A partir de novembro de 1983, o mistério instalou-se na cidade de Hawkins, Indiana, no centro-norte americano, com o desaparecimento de Will Byers, um garoto de doze anos, e enquanto a polícia realiza as buscas, seus amigos fazem descoberta que pode mudar os rumos da humanidade. Esse é o mote que dá azo às mil reviravoltas de “Stranger Things”, que chega à quinta temporada como sinônimo irrefutável de consagração popular e respeito dos críticos — e envolta em polêmicas ainda por serem mais bem explicadas. O texto dos irmãos Matt e Ross Duffer continua a brincar com os desejos do espectador (sobretudo os mais fiéis), prova de que a série conseguiu superar o desafio de não acomodar-se ao sucesso e reinventar-se. Juntamente com o público.

Depois do terremoto de magnitude 7,4 que sacode Hawkins, Will, Mike, Lucas e Dustin, os “quatro originais”, reencontram-se, mas os irmãos Duffer conferem destaque especial a Onze, a garota cujos poderes sobrenaturais garantem acesso ao portal para o Mundo Invertido, a Hawkins às avessas, a dimensão sombria onde habitam criaturas como o Demogorgon e o Devorador de Mentes. Precavidos, os criadores juntaram mais de 650 horas de material, e tamanho esmero reflete-se na profundidade dos novos arcos, conduzidos de maneira prudente e sem prejuízo da aura caótica que define esses dez anos de mágicas estranhezas. Para o desfecho iminente, os Duffer privilegiaram a mitologia que já se firmou em torno de “Stranger Things”, com direito a algumas espertas piadas metalinguísticas, quase indetectáveis, e uma acertadíssima aposta na nostalgia dos anos 1980, exibida no afeto entre os personagens centrais, espichando a olhos vistos, e embalada pela antológica “Running Up That Hill” (1985), na voz de Kate Bush. Noah Schnapp, Finn Wolfhard e, claro, Millie Bobby Brown, a mãe do ano, continuam presentes em mais de 90% das quatro horas e meia que perfazem os quatro primeiros episódios, com um choro de mais três, a serem liberados no Natal, mas veteranos como Winona Ryder e David Harbour não têm nada do que reclamar. A propósito de Harbour, reportagem do tabloide britânico Daily Mail veiculou que Brown teriaregistrado queixa de assédio e bullying contra o colega, seu pai adotivo na série. Talvez este seja o sinal mais evidente de que “Stranger Things” tenha mesmo se esgotado. Essa é a verdadeira esquisitice.


Série: Stranger Things — 5ª temporada 
Criação: Matt e Ross Duffer
Ano: 2016–2025
Gêneros: Drama, ficção científica, aventura, terror, coming-of-age
Nota: 8/10

Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.