Os 5 livros favoritos de Clarice Lispector — e que ela nunca deixou de reler

Os 5 livros favoritos de Clarice Lispector — e que ela nunca deixou de reler

Clarice Lispector dificilmente nomeava seus livros favoritos de maneira formal. Mais comum era encontrá-la, entre frases espontâneas e lapsos de memória, admitindo que certas leituras voltavam com força estranha, como quem relê não para recordar, mas para escavar. Não por conforto. Não por disciplina. Havia nesses livros algo que parecia inacabado — e isso a atraía. Obras como “O Lobo da Estepe”, “Crime e Castigo”, “O Retrato do Artista Quando Jovem”, “Orlando” e “Bliss” surgem assim, não como referências técnicas, mas como combustão silenciosa. Livros que deixaram marca no corpo da escrita.

Ela disse que “O Lobo da Estepe” lhe causou febre. Não uma febre figurada, mas física. Em Dostoiévski, reconhecia a experiência de quem já havia atravessado zonas sombrias. Em Joyce, uma forma de pensamento em espiral. Em Virginia Woolf, o risco de ser livre. Em Katherine Mansfield, o dom de dizer muito antes do enunciado completo. Clarice não se espelhava nessas autoras; escutava nelas o movimento interno. Talvez por isso tenha dito, em mais de uma ocasião, que eram livros que sempre relia. Não por hábito, mas porque havia neles uma pulsação que não cessava.

O modo como essas leituras a acompanhavam não cabia em classificações. Elas não estavam na superfície de seus textos, mas sob a pele. Clarice devolvia essas obras à cabeceira porque algo nelas insistia — e porque sua escrita dependia de fontes assim, que sangravam um pouco, mesmo quando sussurravam. Quando ela falava sobre “Orlando”, por exemplo, não era apenas sobre gênero, mas sobre duração. Sobre tempo e multiplicidade. Quando evocava “Bliss”, era o intervalo entre o gesto e o desejo que a comovia.

Esses livros não explicam Clarice. Mas quem lê Clarice com atenção sabe que, na repetição, havia algo mais do que memória. Havia método, mesmo que inconsciente. Havia uma curadoria íntima de perguntas que nunca deixavam de doer. E para uma autora que escrevia da margem interna das palavras, certos livros não eram companhia: eram condição.

Revista Bula

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