Um dos maiores filmes de todos os tempos chegou à Netflix — e quase ninguém percebeu Divulgação / Sunset Boulevard

Um dos maiores filmes de todos os tempos chegou à Netflix — e quase ninguém percebeu

Poucos filmes desafiaram tanto o tempo quanto “E.T. – O Extraterrestre”, uma narrativa que permanece viva não apenas pela memória afetiva que desperta, mas pela sensibilidade com que capta um anseio universal: o desejo de pertencimento. Steven Spielberg, que já havia consolidado seu nome com sucessos como “Tubarão”, “Contatos Imediatos do Terceiro Grau” e “Os Caçadores da Arca Perdida”, criou aqui algo que transcende o gênero da ficção científica.

Bem além de um conto sobre um ser perdido em um planeta estranho, o filme fala de forma delicada sobre o isolamento emocional, o choque entre a sensibilidade infantil e a dureza burocrática do mundo adulto. A fotografia, por vezes aberta e reflexiva, não que apenas mostrar o cenário suburbano da Califórnia, mas também refletir a vastidão da solidão que cerca Elliott e E.T., dois seres, em essência, igualmente deslocados. Nesse contexto, o sentimentalismo não é uma fraqueza narrativa, mas uma resistência existencial: sentir profundamente, em um mundo que teme a vulnerabilidade, torna-se um ato de coragem.

Rever “E.T. – O Extraterrestre” na idade adulta é, de certa forma, um exercício de arqueologia emocional. Ao contrário de muitos filmes da infância que perdem o brilho quando revisitados, esta história preserva e até amplifica seu impacto, justamente porque convoca um tipo de saudade que a vida adulta raramente permite expressar. Quem cresceu nos anos 1980 sabe que o filme não era apenas entretenimento, mas um ritual coletivo, um código compartilhado entre crianças que pedalavam suas bicicletas como quem desafiava o tédio da rotina.

A atuação extraordinária de Henry Thomas, especialmente quando contracena com um personagem que, tecnicamente, não responde a seus estímulos humanos, demonstra o nível de entrega que Spielberg extraiu de seu elenco infantil. Drew Barrymore, ainda muito pequena, traz uma autenticidade que desafia qualquer leitura cética da narrativa. Mesmo os efeitos especiais, limitados pelas tecnologias da época e criados por Carlo Rambaldi, sustentam sua eficácia emocional justamente por evitarem o hiper-realismo frio das animações digitais contemporâneas. A mágica permanece viva porque o filme não pede que o espectador acredite no impossível; pede apenas que ele se permita sentir novamente como uma criança.

Mas reduzir “E.T. – O Extraterrestre” a uma mera fábula sobre amizade interplanetária seria ignorar sua dimensão mais profunda. A maior qualidade do filme não está no extraterrestre de olhos brilhantes, mas na coragem de seus personagens em desafiar as normas sociais para proteger o que consideram precioso. Há uma clara inversão de papéis: os adultos, figuras tradicionalmente associadas à razão e ao cuidado, aqui são retratados como agentes da incompreensão e da ameaça, enquanto as crianças carregam sozinhas a responsabilidade ética e emocional da história.

Spielberg não romantiza a infância; ele a reconhece como o último bastião da empatia verdadeira, livre do cinismo e da conveniência. É por isso que o choro de Elliott, no fim do filme, não é apenas pela despedida de um amigo, mas pelo reconhecimento doloroso de que crescer significa, muitas vezes, abandonar a capacidade de acreditar no extraordinário.

Filme: ET: O Extraterrestre
Diretor: Steven Spielberg
Ano: 1982
Gênero: Aventura/Drama/Mistério
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★