Crônica

Eusébio — ou as lições de um bonsai que repousa sobre minha mesa de trabalho

Eusébio — ou as lições de um bonsai que repousa sobre minha mesa de trabalho

Tenho um bonsai em cima da minha mesa e é para ele que olho toda vez que exerço uma pausa entre uma linha escrita e uma linha pensada. Tenho angústias, como sói acontecer com pessoas da minha idade, da minha profissão, da minha condição estrangeira, da minha natureza. O bonsai não é angustiado: exala calma, sossego, inércia. É da sua natureza. É sua natureza. É natureza.

Sobre crianças e crocodilos

Sobre crianças e crocodilos

Sem disfarçar o constrangimento, a mãe acorreu, afastou a criança e pediu desculpas pelo transtorno. Assustado, o garoto explicou que só queria saber por que a mulher de muletas tinha uma perna a menos do que todo mundo ali. Não se preocupe, senhora. Eu não me incomodo. Venha até aqui. O pequeno hesitou, olhou para a mãe e ela acabou assentindo. O menino de olhos vívidos permaneceu calado, na expectativa da revelação.

Adi e Oto

Adi e Oto

O homem se contorcia todo, girava sobre si mesmo. Pecha e pose de viajante influenciador digital. Esticava o braço alguns milímetros a mais do que o corpo permitia, era isso que deixava clara sua expressão facial, entre o êxtase e o desespero. Ao seu lado, a mulher parecia lamentar as férias, a companhia, o casamento.

Querem tomar o lugar do Seu Osvaldo?

Querem tomar o lugar do Seu Osvaldo?

Na rodoviária de Quiprocó da Serra de Santo Grande do Sul, Seu Osvaldo resiste à modernidade com o mesmo quepe alinhado e o orgulho de quem ainda oferece um “bom dia” e um cafezinho. Enquanto os aplicativos tomam conta das passagens, ele observa, descrente, o avanço das telas e das inteligências artificiais que não sabem olhar nos olhos. Entre gargalhadas secas e suspiros nostálgicos, Seu Osvaldo se pergunta: se o mundo mudou tanto, será que ainda há lugar para quem trabalha com alma?

Pela volta do povão aos estádios de futebol

Pela volta do povão aos estádios de futebol

Uma multidão animada se espremia sob a poeira para acompanhar o embate decisivo. Cerveja gelada descendo pelas serpentinas. Fumaça de churrasquinho subindo pelo ar. Vira-latas invadindo o campo. Homens apostando dinheiro. Mulheres retocando o batom. Crianças aporrinhando. A animação da turba contagiava-me. Enquanto acompanhava a peleja, a melancolia jorrava dentro de mim como um cano de água furado.