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Chamado de louco. Morto na miséria. O poeta maldito que o Brasil abandonou na calçada

Chamado de louco. Morto na miséria. O poeta maldito que o Brasil abandonou na calçada

Maranhense de 1832, Joaquim de Sousa Andrade atravessou estantes novas, repartições lentas, uma temporada europeia de estudos e sete anos em Manhattan, onde trabalhou em imprensa lusófona e aprendeu a decifrar a cidade a pé. Voltou em 1879, tentou cargos e reformas, desenhou a bandeira do estado, empobreceu, morreu em 1902. Os cadernos ficaram. Nos anos 1960, editores e poetas reabriram as pastas e o retrato se endireitou.

Verve, terceiro disco de Lívia Mattos, é imenso e bonito como se fosse o mar

Verve, terceiro disco de Lívia Mattos, é imenso e bonito como se fosse o mar

Um dia, quando isso tudo acabar, você e eu sentaremos na praia e correremos os olhos pelo álbum de nossas loucuras. E, entre tantas fotos e tantos livros, ouvindo de longe, de novo, como sussurros do tempo os sons que hoje nos deixam surdos, mergulhados de corpo inteiro em testemunhos gentis e relatos encharcados de saudade deste nosso agora, aquela moça que toca sanfona como quem respira nos fará viver de novo. Feito hoje. Feito sempre.

A seleção feminina suprema da literatura brasileira de todos os tempos 

A seleção feminina suprema da literatura brasileira de todos os tempos 

Antes do apito, a noite ainda escura pousa sobre um gramado de páginas. As linhas brancas são datas, a marca do escanteio guarda anotações a lápis; a tinta fresca insiste no cheiro que fica nos dedos. Do túnel, chegam passos contados, o eco das listas, a memória organizada em quatro, três, três, em respirações que procuram posição. A arquibancada cresce devagar, nomes sussurrados sob as luzes. O país aguarda na borda do campo, ouvido atento, mão no corrimão frio. Ninguém explica nada; abre-se espaço para que a história escolha onde tocar primeiro.

A morte chegou antes dos 27. Aos 25 já tinha escrito mais de 200 canções. Virou lenda

A morte chegou antes dos 27. Aos 25 já tinha escrito mais de 200 canções. Virou lenda

Vila Isabel moldou Noel Rosa com quintais estreitos, vizinhos nas janelas e um fórceps apressado que lhe marcou o rosto. Adolescente atento, aprendeu a responder à dureza com humor, frequentou bares de esquina, colecionou conversas e noites longas. O rádio o puxou para auditórios, o cinema o chamou para a luz, mas ele preferia mesas pequenas e lápis afiado. A tuberculose encurtou caminhos, multiplicou lenços, impôs consultas e promessas de repouso. Em 4 de maio de 1937, aos vinte e seis anos, o país acordou menor, por uma ausência irrespondível.

Preso sem acusação. Consumido pelo câncer. O escritor que obrigou o Brasil a encarar a própria vergonha

Preso sem acusação. Consumido pelo câncer. O escritor que obrigou o Brasil a encarar a própria vergonha

Ele nasceu longe das capitais e aprendeu cedo que a linguagem pode ser abrigo e ferramenta. Entre contas do balcão e noites de lápis, atravessou ofícios, eleições, celas e salas de hospital, e devolveu ao país uma maneira de se ler sem retoques. Sua obra fala baixo e fere fundo: números ditos às claras, personagens que respiram pouco, um Estado que aperta, uma família que conta moedas.