O clássico fado que dá nome ao filme, imortalizado por Alfredo Rodrigo Duarte e gravado por Amália Rodrigues em 1962, abre esta narrativa como um prenúncio de singularidade. Almodóvar utiliza este pretexto para ingressar no universo do western, explorando temas como ciclos de vida e a complexidade das emoções humanas. A trama de 31 minutos envolve a conturbada relação entre dois homens, permeada por violência, ora contextual, ora deliberada, entrelaçada com revelações inquietantes.
O cineasta mantém o público cativo do início ao fim, valendo-se de recursos que solidificaram sua reputação: paletas vibrantes, a desconexão intencional reforçada pela fotografia de José Luis Alcaine e uma narrativa que percorre caminhos próprios, embora ecoe grandes sucessos do cinema. Declaradamente inspirado por “O Segredo de Brokeback Mountain”, Almodóvar cria algo distinto, começando pela maneira como constrói os protagonistas e conduz o reencontro de Silva, um caubói envelhecido, com Jake, um xerife e antigo amante.
A história se passa em Bitter Creek, onde Silva busca não apenas confrontar o passado, mas resolver questões pessoais que envolvem seu filho, Joe, um bandido que compartilha seu rancho. A tensão cresce até um bangue-bangue impactante que contrasta com momentos de homoerotismo velado. A nudez de Silva no quarto de Jake, seguida de um diálogo sobre oportunidades perdidas, expõe a vulnerabilidade de ambos, evocando paralelos com diálogos marcantes de clássicos do gênero, sem se tornar mera repetição.
Pedro Pascal e Ethan Hawke interpretam seus papéis com intensidade, capturando os dilemas entre desejo e frustração de dois homens que, em outra vida, poderiam ter construído algo duradouro. Um flashback emblemático sugere o que foi perdido, mas não retira a força da relação atual. Almodóvar, já acostumado a desafiar limites, encontra no inglês um novo terreno para transmitir o que é universal: o conflito entre amor e ódio, sentimentos que atravessam idiomas e culturas com igual profundidade.
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