“Rebel Ridge” não hesita em expressar suas intenções de maneira direta, uma característica marcante do mais recente longa-metragem de Jeremy Saulnier. Reconhecido por sua habilidade em evocar emoções profundas e instintivas no público, Saulnier conduz os espectadores por uma jornada emocional intensa que se estende até o último quadro, desafiando a lógica convencional e manipulando expectativas com destreza, sem qualquer formalidade — deixando o público sem alternativas de reação. A trama, à primeira vista simples, aborda a história de um homem negro submetido a um tratamento desumano e humilhante por parte das autoridades policiais. Saulnier, que também atua como roteirista, enriquece a narrativa ao revelar gradualmente a identidade deste personagem enigmático: um ex-fuzileiro naval marcado pelas memórias da guerra no Iraque, tranquilo e metódico, mas que não tolera as injustiças infligidas por aqueles que deveriam protegê-lo. Com o desenrolar da história, torna-se evidente que “Rebel Ridge” transcende os limites de um filme comum.
Narrativas de excelência não se prendem a uma lealdade cega a qualquer perspectiva, o que pode ser arriscado quando histórias surpreendentes perdem o foco e deixam de ressoar com o público, que eventualmente se cansa de tramas excessivamente autossuficientes. No entanto, “Rebel Ridge” evita essa armadilha. Após Terry Richmond ser atropelado em sua bicicleta por dois policiais brancos, perder os trinta mil dólares destinados à fiança de seu primo, acusado de tráfico, e enfrentar interrogatórios abusivos enquanto tenta escapar de uma possível prisão, inicia-se uma odisséia quase kafkiana para provar sua condição de vítima de abusos inaceitáveis e recuperar seu dinheiro.
Embora a abordagem de Saulnier sobre questões legais não represente uma inovação revolucionária — em contraste com documentários como “A 13ª Emenda” (2016) de Ava DuVernay, que desconstroem de maneira didática e acessível os meandros do sistema jurídico americano e suas falhas em relação aos cidadãos negros — “Rebel Ridge” mantém uma relevância crescente ao longo do segundo ato. Nesta fase, o protagonista, vivido por Aaron Pierre com uma combinação de serenidade e indignação contida, enfrenta diretamente o xerife Sandy Burnne, interpretado por Don Johnson, que conta com a assistência de Summer McBride, uma estagiária idealista e a única que percebe um propósito genuíno em suas ações.
A química entre Pierre e Anna Sophia Robb cria uma conexão que sustenta a narrativa nos momentos em que o diretor canaliza o ímpeto de justiça de seu anti-herói, deixando de lado qualquer espaço para um romance previsível e abrindo caminho para um desfecho inesperado. Trabalhar com um personagem tão equilibrado, porém capaz de empregar a força quando necessário, sempre envolve riscos, mas Saulnier consegue manejar essa dualidade com maestria, garantindo que o filme mantenha seu impacto do começo ao fim.
Filme: Rebel Ridge
Direção: Jeremy Saulnier
Ano: 2024
Gêneros: Thriller/Ação
Nota: 8/10