Agarre uma pipoca e se jogue no sofá para assistir a comédia relaxante com Julia Roberts e Jennifer Aniston, na Netflix Ron Batzdorff / Open Road Films

Agarre uma pipoca e se jogue no sofá para assistir a comédia relaxante com Julia Roberts e Jennifer Aniston, na Netflix

Após superar as inquietações metafísicas sobre os resíduos fisiológicos, as dores da adaptação escolar — o primeiro ambiente onde os filhos começam a fazer escolhas com certa autonomia —, e as batalhas intensas da adolescência, que constantemente mantém os pais em estado de tensão, as mães, enfim, esperam por um momento de alívio. Depois de anos observando à distância o desenvolvimento profissional dos filhos, com expectativas e orações para que eles se estabilizem na carreira, surge, teoricamente, a oportunidade para essas mulheres finalmente cuidarem de si mesmas e fazerem o que adiaram por tanto tempo. Mas será que é tão simples?

No filme “O Maior Amor do Mundo”, de Garry Marshall (1934-2016), a narrativa mostra que, para muitas mães, o desejo de libertar-se dos filhos — ou, mais precisamente, do que eles representam no cotidiano familiar — não é algo trágico, mas uma inevitabilidade. O longa, que marca a despedida de Marshall do cinema e da vida, apresenta uma trama que, embora irregular em vários aspectos, carrega a empatia característica do diretor ao explorar como as dificuldades cotidianas, tão comuns, muitas vezes revelam o quão distantes podemos estar de ser pessoas tolerantes, amorosas ou pacientes.

A maternidade (e a paternidade) se entrelaçam nessas questões de forma complexa, e o roteiro coescrito por Marshall, juntamente com outros quatro colaboradores, sugere que cada um deve lidar com os rancores acumulados da forma que melhor puder, mesmo que esses ressentimentos venham de quem, paradoxalmente, mais se ama.

Ao longo de sua carreira, Garry Marshall se especializou em retratar adultos complicados, muitas vezes desconfortáveis com a vida madura que supostamente deveriam estar controlando. Em “O Maior Amor do Mundo”, essa característica está claramente presente. Um exemplo é Sandy, uma mulher atraente de meia-idade, que tenta curtir a vida depois de um divórcio recente com Henry. No entanto, as coisas se complicam quando Henry, interpretado por Timothy Olyphant, decide se casar novamente, desta vez com Tina, uma mulher bem mais jovem, vivida por Shay Mitchell.

Sandy, autossuficiente e orgulhosa, não consegue admitir o ciúme que sente — talvez até um pouco de inveja. Mas o problema vai além: o que realmente a apavora é a ideia de que seus filhos possam gostar mais de Tina do que dela, algo que parece mais que possível, a menos que ela consiga se recompor. Jennifer Aniston, que dá vida a Sandy, oferece uma atuação surpreendentemente cativante, ofuscando até mesmo alguns dos outros nomes de peso no elenco, como Julia Roberts, que, apesar de sua presença marcante, parece ter sido incluída no filme apenas como um favor ao amigo Marshall.

A personagem de Roberts, Miranda Collins, é uma celebridade da TV que escreveu uma série de livros considerados de baixa qualidade, e sua decisão de se afastar unilateralmente da filha, em prol da carreira, revela-se um erro que o destino logo fará questão de corrigir. A jovem Kristin, interpretada por Britt Robertson, está determinada a reencontrar a mãe, e um segundo rejeição, agora premeditada, poderia sabotar os planos de Miranda de dominar tanto a televisão quanto o mercado editorial.

Quando a possibilidade de lucrar com essa reunião familiar lhe passa pela cabeça, Miranda prontamente reconsidera a ideia, e o desejo de reconectar-se com a filha torna-se, então, uma questão de estratégia profissional, mais do que um sentimento genuíno.

Esse ponto de virada poderia ter sido o grande trunfo do filme, explorando de forma mais crítica e ácida as complexidades e hipocrisias nas relações familiares. No entanto, a necessidade de entregar uma comédia leve e acessível ao grande público — algo que Marshall sempre soube fazer com maestria — dilui a profundidade da trama. A presença de uma peruca chanel ruiva e artificial usada por Roberts é um exemplo disso: o adereço tinha potencial para sublinhar de forma poderosa as falsidades e construções superficiais dessas relações, mas essa oportunidade foi perdida.

Embora as mães retratadas no filme estejam longe da perfeição, o título “O Maior Amor do Mundo” só faz sentido se encarado com ironia. O desejo de Marshall de ser abrangente, de falar para diferentes públicos de maneira indiscriminada, acaba sendo um obstáculo para o desenvolvimento mais profundo da história. Talvez, já consciente de que seu tempo era curto, ele tenha tentado abarcar muitos temas de uma só vez.

Se o diretor tivesse optado por concentrar-se em um único núcleo familiar, teria sido possível explorar com mais clareza e intensidade o quanto a falsa crença de que pais e mães jamais erram é uma das maiores ilusões da vida familiar. Em vez disso, o filme entrega uma narrativa dispersa, que tenta agradar a todos e, no processo, perde muito de sua força crítica e emocional.

Mesmo assim, “O Maior Amor do Mundo” tem seus méritos. É um filme que consegue, ainda que superficialmente, tocar em questões sensíveis sobre as relações familiares, o envelhecimento e as expectativas da sociedade em torno da maternidade. O problema é que essas questões acabam sendo suavizadas em nome do entretenimento, deixando o público com a sensação de que algo mais profundo poderia ter sido dito, mas foi deliberadamente evitado.


Filme: O Maior Amor do Mundo
Direção: Garry Marshall
Ano: 2016
Gêneros: Romance/Comédia
Nota: 7/10