Aplaudido de pé no Festival de Cannes, thriller eletrizante com Ricardo Darín está na Netflix Divulgação / Paris Filmes

Aplaudido de pé no Festival de Cannes, thriller eletrizante com Ricardo Darín está na Netflix

O cinema argentino tem conseguido manter de maneira exemplar a tradição de produzir filmes de alta qualidade, com narrativas diversificadas e, principalmente, um elenco de grande talento, com destaque para Ricardo Darín, um dos atores mais renomados da Argentina e muito admirado também no Brasil. “Abutres” é um exemplo que se encaixa perfeitamente nesta descrição, com Darín interpretando um papel profundamente dramático e melancólico, sempre na medida certa conforme a narrativa exige.

Este filme marcou o início da colaboração bem-sucedida com Pablo Trapero, que conseguiu extrair de Darín momentos de intenso lirismo — algo que ele repetiu com brilhantismo em “Elefante Branco” — e explorou ao máximo o romantismo feroz presente no roteiro, escrito em conjunto com Alejandro Fadel, Martín Máuregui e Santiago Mitre. Um elemento crucial para a trama é a tensão que permeia todo o filme, servindo de guia para o espectador.

As cenas em preto e branco de um acidente de carro não deixam dúvidas: a brutalidade e o lado mais sombrio do ser humano são apresentados de forma perturbadora, com as figuras sombrias de uma Buenos Aires desprovida de glamour tomando conta da noite e buscando seu sustento, uma ideia semelhante à explorada por Dan Gilroy em “O Abutre” (2014). Sosa, um ex-advogado interpretado por Darín, representa essa ideia, vivendo de suas andanças pela madrugada em busca de vítimas de acidentes e outras tragédias, oferecendo serviços funerários e apólices de seguro de vida, muitas vezes sem cumprir o prometido.

 Logo depois, Sosa aparece sendo agredido por indivíduos suspeitos durante um enterro. Esses fragmentos do submundo de Buenos Aires são bem interpretados por um homem bonito, mas que carrega a marca da vulgaridade, até que encontra sua alma gêmea. Luján Olivera, uma médica especializada em emergências em uma metrópole com uma alta demanda por seus serviços, cruza o caminho de Sosa e, a partir de então, Martina Gusmán se junta a Darín, confundindo o espectador com uma interpretação que varia entre a suavidade e a tensão, compartilhada com o anti-herói de “Abutres”.

No início do terceiro ato, Trapero mergulha de vez na essência noir de seu filme e expõe o modus operandi dos negócios de Sosa. Um golpe arquitetado por Casal, o mafioso interpretado por José Luis Arias, resulta em uma tentativa de extorsão, trazendo mais violência para a vida de Sosa e Luján. Sem qualquer tipo de condescendência, este trabalho do diretor é mais uma produção notável do cinema argentino, conhecida por suas narrativas originais e complexas, cheias de reviravoltas, e que não se submetem a ideologias. Nesse aspecto, a distinção em relação aos seus colegas brasileiros é evidente.


Filme: Abutres
Direção: Pablo Trapero
Ano: 2010
Gêneros: Crime/Thriller
Nota: 8/10