Ássia, de Ivan Turguêniev

Ássia, de Ivan Turguêniev

Li “Ássia”, de Ivan Turguêniev, e a novela do escritor russo mais ocidentalizado do século 19 é uma obra prima. Ássia é um dos apelidos de Anna Nikoláievna, uma garota russa de espírito livre. O narrador, que parece ser o próprio Turguêniev contando suas aventuras e agruras românticas, conhece um casal de irmão na Alemanha, local que escolheu para sua despedida da juventude sem compromissos e, após, encarar as responsabilidades da maturidade.

Ássia é uma vítima das situações. Órfã de pai e mãe, tem apenas o irmão e, por isso, não se sente presa a regras. Ela se encontra na interface — saindo da adolescência para a juventude. Tem um comportamento oscilante, misterioso, encantador. “Era a sua alma que me agradava”, conta o narrador quando se vê fascinado pela menina que não entende, mas que é em certo ponto selvagem e, por conta disso, atraente. Ássia possui a ingenuidade doce das crianças. Possui a fisionomia serena e casta, o rosto pálido, mas vívido. Ela é a Tatiana, de Púchkin.

 Assia
Ássia, de Ivan Turguêniev (Editora 34, 96 páginas)

Duas coisas acontecem simultaneamente. Uma delas está associada ao comportamento diletante do narrador que avalia a importância da arte por meio da pintura. O irmão de Ássia, Gáguin, é um exemplar ideal do homem supérfluo e deseja possuir a habilidade de pintar. Possui inspiração, algum talento, e quer desenvolver uma técnica única. Turguêniev avalia, pelos olhos de suas personagens, o rigor artístico e a delicadeza de um estilo que fala, de muitas maneiras, sobre os sentimentos do autor, universais, capazes de comunicar uma mensagem.

Nesse sentido, as linhas do texto de Ássia são como uma pintura, onde cada pincelada é pensada metodicamente, cada cor compreendida no profundo ambiente de uma inspiração pura e magnífica. A outra, trata da maturidade para o amor. O romance oscila entre a certeza do sentimento e a confirmação da reciprocidade. Tem fundamento na escolha que fazemos do uso das palavras quando necessariamente precisam ser ditas ou quando, estas mesmas palavras, precisam ser caladas. “A pedra atirada não volta”, porém, a pedra nunca atirada não atinge um alvo! No descompasso dos dois amores, Turguêniev descobriu o famoso: “Só se dá valor quando se perde!”

“Ássia”, trata da pressa da juventude. Tudo precisa ser rápido, instantâneo. Ássia é assim, impulsiva. Não joga! Não deixará para depois o que deseja agora. Perdeu muito na vida, não quer arriscar perder mais. Faz isso instintivamente. A síntese do livro está na afirmação máxima do narrador: “A felicidade não tem dia de amanhã; nem mesmo de ontem; ela não se lembra do passado e não pensa no futuro; ela tem o presente — e, ainda assim, não um dia, mas um átimo”.

A felicidade depende tanto do outro, mas também de uma decisão precisa. De abrir-se para um sentimento, mas sem a certeza de que ele é real o preço que se paga pelo silêncio pode ser alto. Mas a confirmação está associada ao limite. Para estar convicto é preciso perder. O narrador não sabe que está apaixonado, Ássia tem toda a certeza e espera que em troca o sentimento seja máximo. “Ofereceu-me sua juventude sem máculas.” O fato é que existe um momento mágico, na altura máxima dos sentimentos, para que dois se unam. Se amarão com a força de seus corpos e com a ingenuidade de suas almas. Mas isso precisa ser dito. Categoricamente, pelo menos para Ássia.

“Ássia” é uma novela perfeita! Turguêniev é mais solar que Tchekov, um dos maiores expoentes mundiais do conto literário. Talvez por ter colhido em outras paisagens inspirações. Talvez por ter amado, sofrido e visto, em mundo amplo, formas variadas de sentir, de amar e de sofrer.


Livro: Ássia
Autor: Ivan Turguêniev
Tradução: Fátima Bianchi
Páginas: 96 páginas
Editora: Editora 34
Nota: 10/10