Bula de Livro: Mamíferos, de Pierre Mérot

Bula de Livro: Mamíferos, de Pierre Mérot

Trigésimo oitavo (38º) livro lido, em 2023: “Mamíferos”, do francês Pierre Mérot. Em poucas palavras: “Toda família clássica sente-se na obrigação de ter um fracassado: uma família sem fracassado não é uma família de verdade, porque lhe falta um princípio que a conteste e lhe dê legitimidade”.

Pierre Mérot
Mamíferos, Pierre Mérot

Dividido em três partes: “Gastrite erosiva”, “Perdido na infância” e “Roupa suja”, “Mamíferos” desafia os paradigmas da literatura convencional, tecendo uma narrativa irônica e, às vezes, perturbadora sobre a vida boêmia em Paris. Mérot oferece um retrato descompromissado e brutalmente honesto da realidade urbana. O seu protagonista, que atende pelo nome de Tio, é uma figura anti-heroica e decadente que se deleita em seu próprio caos, desafiando as normas sociais e destruindo, metaforicamente, a noção romântica da vida parisiense.

O autor questiona, com humor ácido, o materialismo e a superficialidade da sociedade contemporânea, criando uma narrativa que atinge o leitor como um cruzado de direita: “O trabalho é uma das causas essenciais da desgraça humana. A outra é o amor”.

Não é um livro para todos. A franqueza quase repugnante e a completa falta de remorso do protagonista (que tem ânsias de vômito quando escuta algo que considera absurdo) faz lembrar Thomas Bernhard e o torna tão detestável quanto fascinante: “Você não se pertence. Você nunca se pertenceu. Ocupam e saqueiam seu corpo desde o seu nascimento. Sua única residência na terra, essa massa de células que pelo menos poderia ser um breve hino, uma adesão ainda que consternada ao sol, aquilo em que você morre, você e não outro qualquer, você não a frui. Você trava uma luta extenuante e, para destruir o inimigo que está dentro de você, é você mesmo que você destrói”. Um livro único que merece ser lido.


Livro: Mamíferos
Autor: Pierre Mérot
Páginas: 288 páginas
Editora: Companhia das Letras
Nota: 9/10