Não vos desanimeis. Animais, como eu…

Não vos desanimeis. Animais, como eu…

O texto a seguir transcreve ipsis litteris o pronunciamento, em rede de rádio e televisão, do Senhor Jurandir Menthias Brügger-Taurus, excelentíssimo, ilustríssimo e sapientíssimo rei da Bazófia.

“Meus caros bazofianos,

Todos sabem do momento complicado que (sic) estamos passando com essa tal peste vermelha, também conhecida como gripezinha ou febre chinesa. Esse micróbio comunista veio do outro lado do mundo só pra infernizar a minha vida e a vida da nossa gente.

 Ele não vai conseguir. Em primeiro lugar, porque sou um homem de Deus e, como está escrito nas sagradas escrituras, os filhos de Davi triunfarão. Assim como os profetas triunfaram sobre Baal, eu também triunfarei em nome de Deus. Eu sou o messias que veio tirar o povo da Bazófia da treva comunista, e nada vai me deter.

Quero garantir a vocês que todas as medidas possíveis, e até as impossíveis, estão sendo tomadas para controlar a peste com eficiência e sem causar prejuízos a economia. Tivemos que aumentar o preço de alguns alimentos e do combustível, mas isso daí é coisa normal. Estamos cuidando da economia com muita competência. Vocês já devem ter notado a incrível mudança na vida de vocês com as nossas medidas arrojadas e eficazes.

No tocante ao enfretamento da peste, assumimos, desde o começo, uma postura firme e corajosa. Modéstia à parte, eu sou homem acostumado à dureza da vida, e aprendi a lidar com as mais difíceis situações durante anos e anos integrando (sic) as fileiras do nosso valoroso exército real.

A primeira coisa: não criar pânico. Não precisa de histeria. Alerto mais uma vez sobre as informações veiculadas nos jornais. Todos eles são esquerdistas, tendenciosos e contra o rei. Cuidado com o que vocês leem. Recomendo que busquem informação confiável nos seus grupos de WhatsApp familiares. A família é a base da nossa sociedade. Se vem da família, é confiável, tá ok?

A imprensa bazofiana distorce a verdade. Eles querem (sic) acabar comigo e com a minha real família. Adoram superdimensionar o poder desse micróbio. Querem criar o desespero, a balbúrdia. Tudo bem que, em outros reinos, houveram (sic) algumas mortes. Aqui é diferente: o bazofiano não pega nada. Nós vemos aí o sujeito pulando no esgoto, mergulha lá e não acontece nada com ele. Nós somos fortes por natureza e não vamos nos acovardar. Nós não somos um reino de maricas.

Um aspecto muito importante: o reino não pode parar. O povo quer trabalhar, e se vai aglomerar, qual o problema? Vida que segue. Dizem que eu estou mais preocupado com a economia do que com a vida. Pura maledicência. Sem cobre no bolso, você morre de fome, de depressão, de suicídio. Eu não sei falar inglês, mas sou contra esse negócio de lockdown. Isso não dá certo aqui, como não deu certo em lugar nenhum. Inclusive eu vi aqui no meu WhatsApp que a Suécia não fez esse tal lockdown e a sua economia está ótima. Vamos defender a nossa economia. 

Outra medida crucial é o tratamento precoce. Rogamos a Deus que ninguém adoeça. Mas esse micróbio é igual chuva: fecha o tempo, vem trovoada e você vai se molhar. E temos que tocar o barco. Caso você adoeça, nós temos a solução simples e barata. Recomendamos remédios acessíveis, produzidos aqui na Bazófia. Essa não é uma recomendação aleatória. Fizemos uma investigação criteriosa para indicar esses remédios. O meu filho, que é especialista em pesquisa em redes sociais, fez uma ampla revisão sistemática em todos os grupos de WhatsApp e me indicou as melhores opções terapêuticas.

No tocante as (sic) vacinas, nós nunca fomos contra, como a imprensa propaga. Inclusive, a palavra vacina vem do latim e significa “derivado da vaca”. E os bovinos são animais pelos quais eu tenho especial admiração, principalmente pela sua obediência. Só que as vacinas são caras e não têm comprovação científica como tem o tratamento precoce. Além disso, vacinar é perigoso. Existem relatos de pessoas que tomaram essas vacinas e se transformaram em animais como lagartos e outros répteis. Aqui na Bazófia, as vacinas não serão obrigatórias: toma quem quer. Somos um reino democrático.

Essa questão de usar máscaras é outro ponto que eu quero esclarecer. Eu sou contra. Não gosto de usar. É um troço muito incômodo, que atrapalha muito a respiração. Além disso, a eficácia da máscara é quase nula. Não funciona e ainda pode causar sérios problemas de saúde. A minha assessoria científica me informou que o uso frequente dessas máscaras está causando alergias, sensação de desconforto, sufocamento e até desmaios. Pra falar a verdade, eu já estou de saco cheio (desculpem a expressão) de ouvir essa mídia irritante falar o tempo todo: o rei não usa máscara. Já deu, né, ó imprensa? Eu não uso e não recomendo. Mas usa quem quer. Somos um reino democrático

Agora, chega de problemas, vamos falar de coisa boa: acabei de assinar os decretos com novas regras para compra e uso de armas em todo o reino. Aumentamos, de 4 para 12, o limite de armas que o cidadão de bem pode adqüirir(sic). A imprensa nojenta já está me atacando e dizendo que o pobre não vai ter dinheiro pra comprar sua arma. Calúnia! Maledicência! Cada um compra a arma que pode pagar, ora essa. Os decretos se referem a todo tipo de armas. O cidadão pode comprar um estilingue, um bodoque, um porrete, uma faca, um punhal, uma garrucha, um revólver, uma pistola, um rifle ou uma metralhadora. O importante é se armar. Vou fazer uma piada aqui, tá ok? Vamos receber esse micróbio chinês a bala.

Como mensagem final, quero dizer à minha gente que mire-se (sic) no meu exemplo, na minha coerência e valentia. Na hora de adversidade, temos que ser e seremos fortes. Por isso eu digo: bazofianos, diante dos desafios da vida, não vos desanimeis. Animais, como eu!

Boa noite.”