O que um refrigerante nos ensina sobre 2020

O que um refrigerante nos ensina sobre 2020

Durante anos a Coca-Cola teve um slogan absurdamente simples: “Coca-Cola é isso aí”. Eu achava o slogan mais estúpido do mundo. Como assim, “é isso aí”? Propaganda não é pra ser tão sincera assim. É por isso que comercial de whisky sempre mostra bebedores com a cara do Brad Pitt, não com a do Bukowski. Honestidade não faz bem pros negócios. Mas depois eu saquei a genialidade da coisa. E no começo de 2021 me dou conta que a Coca-Cola trouxe a melhor resposta para a pergunta “Que cazzo de ano foi esse?”

Pensa comigo: todo médico faz questão de dizer que Coca-Cola faz mal, é açúcar puro, etc. Dá pra desentupir pia com o troço. Mas não adianta. “Coca-Cola é isso aí”, a gente sabe. E a gente toma. Se não quiser, tem Pepsi, que é pior. A empresa não precisa esconder, mentir, inventar. Porque quase todo mundo vai tomar mesmo assim. Então fala a verdade. “Coca-Cola é isso aí.” E se não gostar, dane-se: tem outros 300 milhões que vão tomar.

Isso tem tudo a ver com 2020. Com a nossa vida, aliás. No fim do ano teve um monte de comerciais, vídeos e textos tentando deixar uma mensagem positiva embrulhada com um punhado de “ensinamentos” que 2020 teria nos deixado. Quer saber? Tudo papo furado.

O resumo do ano é esse: máscara, álcool em gel e confusão. Tudo isso iluminado pelo pantanal ardendo em fogo. Não aprendemos nada. Aliás, se deixarem, a gente faz tudo errado de novo. A humanidade não se pauta pela inteligência e razão. Passe cinco minutinhos lendo comentários nas redes sociais e você vai concordar comigo.

E, olha, numa perspectiva histórica, 2020 até que foi um ano suave. Pergunte para quem viveu na Idade Média como era um dia normal: cerco com flechas ardentes, peste negra e esgoto a céu aberto. Viver nunca foi fácil. Mas provavelmente poucas pessoas naquela época prefeririam estar mortas a viver aquela merda de vida. Porque a vida é dura, mas é melhor viver do que morrer. É tão óbvio que chega a doer, não é?

E vida só tem uma. Pode não ter tantas noites regadas a champagne na Riviera Francesa, mas… “é isso aí”. Não dá para trocar por Pepsi. Se você acredita em reencarnação pode torcer para reencarnar na pele de um sultão dos Emirados Árabes. Talvez a vida fique mais confortável. Mas não conte com isso. Na dúvida, trate de curtir a vida que tem. Se você está lendo esse texto é sinal de que está vivo. Já tá no lucro.

Então vamos combinar: 2020 foi estranho, esquisito, tenso. Mas não caia na armadilha de achar que tem que aprender algo com ele. Até porque, se o ano veio para ensinar algo, a maioria não entendeu. Não veio um manual junto nem uma nota de rodapé explicativa. Na verdade, a melhor coisa de 2020 é que ele acabou.

E se 2021 for pior do que 2020? Deus me livre, mas… vai por mim, a gente vai passar por ele também. De alguma forma vai dar tudo certo. A gente vai viver e aproveitar do jeito que der. É a especialidade da raça humana: somos teimosos. A vida é isso aí. Não é lá essas coisas, mas a gente engole mesmo assim.