Maradona, meu primeiro vilão no futebol

Maradona, meu primeiro vilão no futebol

Morreu Diego Armando Maradona. E, como li em alguma declaração de homenagem, não interessa o que você fez da sua vida. Me interessa o que você fez na minha. E nesta, Maradona foi, de certa forma, um primeiro antagonista. O super-herói de carne e osso que eu tive quando me dei por gente foi Zico, contemporâneo do argentino no futebol. Ambos lideraram, principalmente na primeira metade dos anos 80, a principal rivalidade sul-americana no futebol.

Talvez por isso, a competição de Maradona, para mim, nunca foi realmente em nível de Pelé, mas com o Galinho de Quintino. Dieguito era o vilão.

E não dá para esquecer que, naquele jogo em 82, quando a seleção brasileira sambou na cara dos argentinos, o baixinho deles tirou o volante Batista da Copa com um pontapé na coxa. Coisa de vilão, mesmo. No jogo seguinte, sem o ótimo marcador, contundido, o timaço do Telê ficou mais desprotegido. E os melhores do mundo perderam para a Itália de Paolo Rossi.

Quatro anos depois, quando fez o antiético e antológico gol com a mão, Maradona levantaria a Taça Fifa no mesmo ano em que o meu favorito Zico errava um pênalti fatal depois de quase um ano tentando a recuperação de uma gravíssima agressão sofrida no joelho pelo carniceiro Márcio Nunes, do Bangu.

O argentino deixou momentos inesquecíveis nos gramados, um legado preciso ao futebol-arte: naquele mesmo jogo em que revelou ao mundo la mano de Dios, fez também o gol de construção individual mais incrível da história das Copas, saindo de seu próprio campo e driblando mais de meio time inglês. O anti-herói vingava as Malvinas e virava lenda hermana.

Outra prova de sua grandeza foi ter sido a estrela maior no Napoli daqueles anos 80 (com a grande colaboração dos brasileiros Careca e Alemão) que conquistou dois inéditos títulos italianos e uma Copa da Uefa (o equivalente hoje à Liga Europa, o segundo torneio mais importante do continente).

O extracampo terrível de Maradona já corria solto nessa época, mas só interferiu de fato em sua carreira, na década seguinte, quando ele foi pego no antidoping duas vezes, uma por uso de cocaína, pelo Napoli, e outro na Copa de 1994, pela Argentina. A partir de então, a decadência em campo veio junto com a dependência química.

Teve ainda uma carreira como treinador, a qual não pode ser considerada apenas discreta porque teve no currículo o comando da seleção argentina na Copa de 2010, na África do Sul, em uma campanha razoável (eliminada nas quartas-de-final pela Alemanha, numa derrota por 4 a 0).

Com posição política sempre ligada à esquerda, Diego tatuou a figura de Che Guevara no braço e Fidel Castro na panturrilha. Curiosamente, o craque morreu no mesmo dia em que, quatro anos atrás, foi-se o comandante cubano.

Se o histórico que Diego Armando Maradona deixa fora dos campos é bastante polêmico, não há apreciador do esporte mais popular do mundo que possa negar sua contribuição fantástica à plástica nas quatro linhas.

Na minha infância, ele era o vilão da rixa com o super-herói Zico. Mas só tinha esse papel por eu ver, com as retinas de criança, o que era capaz de produzir aquele corpo compactado com uma perna esquerda mágica.

El Pibe de Oro, El Diez, Dieguito. Descanse em paz, no Olimpo do futebol.