Senta aqui. Vamos conversar sobre o suicídio

Senta aqui. Vamos conversar sobre o suicídio

Quando a conheci, ela tinha 60 anos. Era uma mulher bonita, sempre maquiada e impecavelmente vestida. Carregava um bom humor que contagiava as pessoas a sua volta. Eu gostava das nossas conversas, que eram recheadas com relatos sobre cultura e dicas de bons livros. Porém, um dia, ela apareceu totalmente modificada. Não sorria. Sua pele pálida não continha mais aqueles tons vibrantes do blush rosa; ela estava sombria: o filho de 30 anos havia se suicidado.

O rapaz tinha depressão. Estava medicado e parecia bem, segundo ela. “Mas eu não percebi os sinais que ele me dava”, minha amiga me disse entre soluços e desconsolo. Antes de ir embora, me abraçou e nós duas choramos. Chorei por ela. Chorei pelo filho dela. Chorei por mim.

Naquele tempo, eu tratava de uma depressão havia alguns anos. Mas ainda vivia numa montanha-russa de emoções. Entre períodos de melhora, haviam noites mal dormidas e dias de pessimismo. Várias crises de ansiedade e choro. A dor era tamanha que não cabia mais dentro de mim. Parecia não haver sentido em continuar vivendo com o peso de toda aquela angústia.

Algumas vezes, pensava em sumir; desaparecer. Era um anseio de destruição, de deixar de existir. A mente que sofre tem a capacidade de criar situações assustadoras. Entretanto, apesar de todo pensamento ruim que me corroía a alma, meu interior me chamava para a vida. É que quem pensa em suicídio não deseja morrer de verdade. A pessoa só quer parar de sofrer. Porém, o pensamento de acabar com a própria vida é dilacerante. É a tonalidade mais escura da solidão.

Então, um dia, a minha dor ficou tão insuportável que desisti de lutar sozinha contra ela. Eu me entreguei ao sofrimento; pode não parecer, mas foi essa consciência que me iluminou. Enquanto eu tinha resistido, inconscientemente, só consegui me afastar de mim mesma e me afundar cada vez mais em pensamentos ruins. Mas, quando resolvi me entregar àquela tristeza, reconheci que ela existia e que eu precisava tomar alguma atitude. Assim, pedi ajuda: contei aos meus pais o que se passava comigo, voltei ao psiquiatra e comecei a fazer terapia.

O dia 10 de setembro é o Dia Mundial da Prevenção do Suicídio. Desde 2014, a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), em parceria com o Conselho Federal de Medicina (CFM), organiza nacionalmente o Setembro Amarelo. Esta campanha tem como objetivo o diálogo sobre o suicídio, buscando a sua prevenção.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a cada 40 segundos uma pessoa comete o suicídio no mundo. No Brasil, a cada dia, 32 pessoas se suicidam. É uma triste realidade, que registra cada vez mais casos, principalmente entre os jovens. Por isso, falar sobre o suicídio não pode ser mais considerado um tabu. Principalmente porque, na maioria das vezes, é possível evitar que esses pensamentos suicidas virem realidade.

Geralmente, quem pensa em se matar demostra alguns sinais que podem ser reconhecidos: “quero sumir”, “não tenho mais valor”, “ninguém sentirá a minha falta”. Esses sinais não são “drama”, nem “falta de Deus” ou “para chamar a atenção”; é a dor que está falando. Por isso, é preciso olhar para essas pessoas com mais empatia e sem preconceito. “Encontrar alguém que tenha disponibilidade para ouvir e compreender os sentimentos suicidas fortalece as intenções de viver.”

Quando falo sobre mim e conto o que passei, parece que estou falando da vida de outra pessoa. Por isso, sinto que é meu dever falar sobre esse tema, não somente como médica e escritora, mas também como um ser humano que um dia pediu ajuda e foi atendido.

Se você está sofrendo, peça ajuda. Se você tem algum amigo ou parente que parece não estar emocionalmente bem, ofereça ajuda. Procure um psiquiatra. Busque orientação na cartilha Suicídio — informando para prevenir. Segundo os especialistas, esconder o assunto não é o caminho para se prevenir o suicídio.