Uma instrutora de dança de Chicago viaja sozinha nas férias de fim de ano para um pequeno reino europeu, determinada a encontrar alguma pista sobre a família biológica que nunca conheceu. Ao chegar a Havenshire, descobre um país que vive para o baile de Natal do palácio e uma monarquia que mantém sob guarda os registros capazes de esclarecer o próprio passado. A partir do momento em que o castelo precisa de alguém para preparar o príncipe para a valsa oficial, “Era Uma Vez… Um Baile de Natal” aproxima a trajetória íntima da visitante da rotina pública da realeza.
Dirigido por Don McBrearty, o filme tem Danica McKellar como Chelsea e Oliver Rice como o príncipe Phillip, cercados por conselheiros, criados e familiares que representam diferentes graus de apego às tradições do reino. A produção assume o formato de romance natalino com humor leve, apostando em encontros marcados por neve, guirlandas e salões decorados. O ponto de partida é simples: uma mulher adotada tenta descobrir de onde veio, um herdeiro tenta negociar o próprio espaço dentro de um esquema de poder rígido, e o baile anunciado desde o começo funciona como prazo para que os dois definam como querem viver.
O enredo divide o olhar entre a busca de Chelsea por documentos e a resistência inicial de Phillip às aulas de dança. Ela insiste em acessar arquivos guardados pela administração do palácio, cruza informações com moradores locais e se apega a fotografias antigas como guias para reconstruir a própria história. Ele evita a preparação para o evento que deve exibi-lo como príncipe exemplar e possível marido para pretendentes aprovadas pela família. Ao aceitar as lições da visitante, o príncipe deixa de ser apenas figura decorativa e passa a reagir às situações com mais humor e menos frieza, o que muda também a forma como o entorno o trata.
Danica McKellar compõe uma protagonista que alterna segurança profissional e insegurança pessoal. Nas salas de ensaio, a personagem conduz o príncipe com firmeza, corrige postura, exige atenção ao ritmo, insiste em repetições quando percebe desinteresse. Fora dali, hesita ao falar sobre adoção e demonstra medo de encontrar respostas que possam contrariar a imagem que construiu da infância. Oliver Rice, por sua vez, interpreta Phillip como alguém treinado para discursos e aparições oficiais, mas pouco à vontade com contato direto. As primeiras aulas expõem essa rigidez; com o avanço da preparação, o corpo começa a corresponder às exigências da dança e o comportamento se torna menos defensivo.
A direção de Don McBrearty privilegia clareza nas relações espaciais e na progressão dos encontros. As cenas em interiores do castelo exploram salões amplos, corredores discretos e escritórios cheios de pastas e carimbos, reforçando a sensação de que o acesso à memória oficial depende sempre de intermediação. No lado externo, a cidade aparece em ruas estreitas, mercado de Natal e praças cercadas de luzes, o que ajuda a estabelecer contraste entre o mundo controlado da corte e o cotidiano da população. A fotografia faz uso frequente de luz quente em ambientes internos, construindo um clima de abrigo que dialoga com a ideia de família procurada pela protagonista.
As sequências de dança são centrais para acompanhar a aproximação entre os dois personagens principais. A câmera mantém distância suficiente para registrar corpo inteiro, o que permite ao espectador observar erros, correções e ajustes finos de ritmo. Cada ensaio funciona como espaço de negociação: Chelsea insiste em disciplina, Phillip tenta escapar com ironias, até que os dois encontram um meio-termo em que a valsa deixa de ser apenas obrigação pública e passa a sinalizar possibilidade de escolha afetiva. O uso de cortes moderados evita confusão visual e reforça a importância da repetição como ferramenta de mudança.
O roteiro de Marcy Holland mantém foco nas dinâmicas de palácio e nas implicações da adoção sem se aprofundar em conflitos mais duros. A busca por origem se dá por meio de visitas a arquivos, conversas com funcionários antigos e observação de detalhes em objetos guardados há décadas. Quando surgem pistas concretas, a narrativa prefere resolver o mistério com gestos de conciliação e cenas carregadas de emoção controlada, sem alongar tensões. A questão de classe aparece, mas de forma suavizada: Chelsea é uma profissional qualificada que não depende da corte para sobreviver, e o filme sugere que a atração entre os dois passa também pela possibilidade de questionar tradições sem romper inteiramente com elas.
Os secundários reforçam o desenho desse universo. Há conselheiros que defendem o protocolo com vigor e temem qualquer aproximação do príncipe com alguém de fora da nobreza, há empregados que torcem discretamente pela visitante e familiares que oscilam entre a defesa da imagem pública do reino e o desejo de ver Phillip mais satisfeito com a própria vida. Essas figuras ajudam a medir a temperatura política das decisões tomadas dentro do castelo e tornam mais clara a pressão que recai sobre o herdeiro sempre que o baile é citado. Cada comentário sobre futuras alianças, fotografias oficiais ou discursos prepara o espectador para o impacto público de uma dança que começou em ensaios quase secretos.
A trilha musical acompanha esse movimento com temas suaves que marcam encontros, desencontros e pequenas descobertas. Arranjos discretos de piano e cordas surgem em diálogos mais íntimos, enquanto músicas natalinas ocupam ruas, praças e o próprio salão do baile. O som contribui para diferenciar momentos de exposição oficial de instantes em que os dois personagens podem baixar a guarda, o que ajuda a medir avanços e recuos na relação romântica. Em vez de grandes variações, a música propõe pequenas mudanças de tom que refletem a passagem de desconfiança para cumplicidade.
“Era Uma Vez… Um Baile de Natal” se mantém fiel ao conjunto de expectativas que cercam romances ambientados em festas de fim de ano: um cenário acolhedor, um casal que precisa superar reservas e diferenças de origem, um evento público que funciona como prova de fogo para promessas feitas em privado. A produção confia nessa fórmula e prefere investir em gestos, diálogos e rotinas que consolidam o vínculo entre Chelsea e Phillip, sem ambicionar reviravoltas mais duras. Ao fim das luzes do baile, o que permanece é a imagem de um salão em que tradição e desejo de mudança precisam conviver ao som da mesma música.
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