Alguns filmes não pedem aplausos, pedem um abraço. “Caramelo” é exatamente esse tipo de experiência: uma história que chega de mansinho, se acomoda no peito e, quando você percebe, já está com os olhos marejados e um sorriso besta no rosto. O longa conta a trajetória de Pedro (Rafael Vitti), um chef de cozinha que vê a vida parar bruscamente depois de um diagnóstico devastador. No meio do caos, surge um cachorro vira-lata cor de caramelo que, sem pedir licença, vira companheiro, terapeuta e, por que não, guia espiritual. Parece simples, e é. Mas o que o filme faz com essa simplicidade é o que o torna especial.
A relação entre Pedro e o cachorro é daquelas que dispensam palavras. A câmera observa, os silêncios falam e a ternura se constrói nos gestos mais corriqueiros: um olhar, um pedaço de pão dividido, um suspiro compartilhado. O roteiro entende que emoção não se explica, se sente. E é aí que “Caramelo” se destaca. Ele não tenta nos convencer de nada, apenas nos lembra do que já sabemos, mas esquecemos com frequência: que o amor, às vezes, tem quatro patas e late baixinho. A naturalidade com que os dois constroem esse vínculo faz a gente esquecer que está vendo atores. É puro afeto em estado bruto.
A direção acerta ao não dramatizar o sofrimento. Em vez de apelar para a lágrima fácil, o filme aposta na delicadeza. As cenas de Pedro cozinhando, por exemplo, são quase terapêuticas. Há algo de sagrado naquele ato de preparar comida mesmo quando o apetite pela vida parece ter ido embora. O mesmo vale para os enquadramentos: tudo é iluminado por uma luz morna, meio dourada, como se o próprio caramelo do título tivesse derretido sobre o filme. A trilha sonora acompanha no mesmo tom: discreta, mas certeira, guiando as emoções sem empurrá-las goela abaixo.
“Caramelo” não é um drama sobre doença ou superação. É uma celebração sobre o simples fato de estar vivo, mesmo quando viver dói. A presença do cachorro não serve como muleta emocional, e sim como espelho: é nele que Pedro reencontra a coragem, o humor e o carinho que achava ter perdido. A leve ironia de algumas cenas, como quando o cão ignora solenemente os conselhos humanos, é um lembrete sutil de que a sabedoria, às vezes, mora nas criaturas que menos falam.
E há algo de deliciosamente antigo na escolha do diretor de usar um cachorro de verdade. Em tempos de efeitos digitais que transformam tudo em plástico brilhante, ver um animal real em cena tem um impacto quase político. É um gesto de resistência contra a artificialidade: carne, pelo e emoção contra o império do CGI. O filme parece dizer que o cinema ainda pode ser simples e tocar fundo: basta um bom roteiro, uma câmera sensível e um cachorro com olhar de filósofo.
“Caramelo” é daqueles filmes que não precisam de grandes reviravoltas para deixar marca. Ele chega sem alarde, quebra você por dentro e depois te remenda com um sopro de ternura. É sobre o amor que sobrevive ao medo, a amizade que não precisa de palavras e a beleza que existe em continuar mesmo quando o final já é conhecido.
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