Nem todo livro que conquista multidões resiste ao teste do tempo. Alguns romances explodem em vendas, inundam redes sociais, dominam listas de best-sellers e até parecem ter vindo para ficar. Mas, passada a febre, resta um silêncio desconfortável, ou pior: gargalhadas constrangedoras. Porque a popularidade não é sinônimo de qualidade, e o gosto coletivo, muitas vezes volúvel, se deixa seduzir por histórias frágeis, personagens rasos e reviravoltas forçadas. É claro que um sucesso editorial pode ser sincero, pode emocionar e marcar época, mas há casos em que, ao revisitar as páginas ou lembrar do enredo, o leitor sente vergonha alheia. Talvez por isso, tantos desses títulos, idolatrados ontem, hoje sejam vistos com certo deboche. Tornaram-se memes, alvos fáceis de ironias e lembranças constrangedoras do que um dia foi levado a sério.
Não há mal nenhum em gostar do que é popular. O problema é quando a popularidade de uma obra mascara sua fragilidade narrativa. Em muitos casos, o fenômeno midiático faz com que leitores pouco habituados à leitura tratem aquele título como um marco insuperável da literatura, esquecendo que grandes histórias atravessam séculos, enquanto outras mal sobrevivem a um verão. Livros que vendem milhões em semanas, mas caem no esquecimento meses depois, revelam mais sobre as estratégias de marketing e o espírito do tempo do que sobre a qualidade literária em si. Na era das redes sociais, onde hashtags constroem fenômenos e slogans substituem argumentos, a literatura pop muitas vezes se contenta em ser passageira, efêmera e descartável. O culto inicial dá lugar à zombaria, e os protagonistas outrora idolatrados passam a inspirar apenas piadas e olhares constrangidos.
Nesta lista, revisitamos sete livros que, em seu auge, pareciam inquestionáveis: formaram comunidades apaixonadas, inspiraram filmes e séries, e movimentaram milhões em vendas. Mas o tempo, sempre cruel com o que não tem consistência, tratou de colocá-los no lugar onde hoje habitam: o do meme cultural. São obras que talvez tenham servido como porta de entrada para novos leitores e, nesse sentido, merecem algum reconhecimento, mas que não resistiram ao olhar crítico e ao distanciamento histórico. Não significa que não possam divertir ou emocionar alguém ainda hoje, mas é preciso encarar com humor o fato de que já foram vistas como o auge da produção literária contemporânea. Porque, no fundo, a literatura, como tudo que é humano, também tem seus modismos, exageros e fiascos. As sinopses foram adaptadas a partir das originais fornecidas pelas editoras.

Lançado em 2019, Teto Para Dois virou febre entre leitores que buscavam romances leves e reconfortantes. A fórmula irresistível, dois estranhos dividindo apartamento e se comunicando por Post-its, conquistou o TikTok e lotou livrarias. Por um tempo, Leon e Tiffy foram o casal fofo que todos queriam ser. Mas bastou a onda passar para surgirem as piadas: afinal, quantos adultos realmente aceitariam dividir a cama com um desconhecido? E por que eles simplesmente não se encontram pessoalmente? Como acontece com muitos fenômenos pop, o excesso de hype gerou fadiga. Apesar disso, o livro segue como leitura agradável, oferecendo leveza num mundo saturado de dramas pesados. Hoje, Teto Para Dois ocupa o espaço ambíguo das histórias queridas, mas caricaturadas, lembradas tanto pelo seu charme quanto pelas piadas sobre millennials incapazes de resolver um problema sem recorrer a bilhetes coloridos.

Quando foi lançado em 2018, “O Dilema do Porco-Espinho”logo virou best-seller, alimentando o fascínio brasileiro por livros que prometem respostas filosóficas para dilemas cotidianos. Leandro Karnal, um dos intelectuais mais midiáticos do país, usou seu estilo didático e elegante para tratar da solidão, com referências que vão da Bíblia a Schopenhauer, passando por filmes, músicas e até amigos imaginários de infância. O tema, profundamente humano, tocou em cheio leitores que se sentiram acolhidos em meio à era digital e suas relações líquidas. Mas o sucesso também teve seu preço: o livro acabou sendo reduzido a memes de Instagram e virou aquele tipo de leitura que as pessoas citam sem ter lido por completo. Não demorou para que muitos vissem Karnal como “coach de gravata”, um rótulo injusto, mas inevitável diante da banalização de suas ideias. Hoje, “O Dilema do Porco-Espinho” segue relevante, mas também é alvo de piadas sobre intelectualidade fast food e reflexões solitárias compartilhadas em carrosséis do Instagram.

Quando foi lançado em 2016, “A Sutil Arte de Ligar o F*da-se” parecia trazer um sopro de honestidade num mercado saturado por autoajuda melosa e gurus otimistas demais para serem reais. A proposta era simples e brutalmente eficaz: pare de tentar ser feliz o tempo todo e aceite que a vida é feita de fracassos, dúvidas e limitações. O livro virou febre instantânea, principalmente entre jovens adultos cansados de discursos motivacionais açucarados. Mas, como era de se esperar, o sucesso estrondoso trouxe também um efeito colateral curioso: sua mensagem crua foi mastigada, distorcida e resumida a frases de camiseta. Logo, qualquer pessoa que quisesse bancar o “realista sincero” repetia trechos do livro como se tivesse descoberto o segredo da existência. Hoje, A Sutil Arte é ao mesmo tempo referência e piada. Afinal, nada mais contraditório do que um best-seller mundial ensinando a parar de ligar para o que os outros pensam, enquanto faz milhões ligarem para isso.

Lançado em 2011, Cinquenta Tons de Cinza transformou a fanfic erótica num fenômeno mundial. Anastasia Steele e Christian Grey incendiaram as livrarias e levaram ao mainstream um tipo de romance que, até então, circulava discretamente. Milhões de exemplares vendidos depois, o livro virou motivo de piada: acusado de narrativa pobre, personagens rasos e um retrato controverso das relações de poder. Para críticos e leitores mais atentos, o que começou como uma explosão de desejo rapidamente se revelou um amontoado de clichês e cenas mal escritas. Ainda assim, seu impacto cultural é inegável: abriu espaço para que o erotismo feminino deixasse de ser tabu. Mas, com o tempo, Cinquenta Tons passou a ser citado mais como exemplo de “prazer culposo” do que como grande literatura. Hoje, figura ao lado de outros fenômenos passageiros que arrebataram corações, e depois, inevitavelmente, gargalhadas.

Publicado em 2006, “O Segredo” explodiu como uma revelação capaz de transformar a vida das pessoas pela simples força do pensamento positivo. Durante meses, o mundo acreditou que bastava visualizar o sucesso, repetir afirmações otimistas e criar quadros dos sonhos para alcançar qualquer objetivo. Virou febre entre celebridades, empresários e curiosos em busca de riqueza e felicidade instantâneas. Mas não demorou para que o entusiasmo desse lugar à ironia: seria mesmo possível resolver problemas complexos com pensamentos positivos? “O Segredo” virou meme, sinônimo de soluções simplistas para questões profundas. Sua popularidade resiste, mas seu discurso muitas vezes é lembrado com sarcasmo em situações de fracasso. Ainda assim, o livro abriu portas para discussões sobre mentalidade e autoconhecimento, mesmo que seu tom messiânico e suas promessas grandiosas continuem sendo alvo de críticas e piadas.

Quando “Crepúsculo” chegou às livrarias em 2005, poucos imaginavam que a história da tímida Bella Swan e do vampiro melancólico Edward Cullen transformaria a literatura juvenil, e a cultura pop, para sempre. Misturando romance adolescente e criaturas sobrenaturais, Stephenie Meyer capturou o imaginário de milhões de leitores com uma narrativa repleta de suspiros, silêncios constrangedores e olhares intensos. Durante alguns anos, Bella e Edward foram ícones absolutos de uma geração, gerando filas nas livrarias, histeria em eventos literários e bilheterias estratosféricas nas adaptações para o cinema. Mas a febre vampiresca não escapou do desgaste. Logo, o enredo açucarado e os diálogos melodramáticos viraram alvos de piadas na internet e memes que ridicularizam o excesso de romantização do sofrimento amoroso adolescente. Apesar das críticas e do riso fácil que hoje cerca a saga, “Crepúsculo” continua sendo uma leitura emblemática da juventude dos anos 2000, um prazer (ou um constrangimento) nostálgico que muitos não admitem publicamente.

Publicado em 1936, este clássico da comunicação nasceu como um guia para relações humanas mais empáticas e verdadeiras. Com o tempo, tornou-se um best-seller mundial e, décadas depois, o manual de cabeceira de todo vendedor de curso motivacional. O livro ensina lições simples, como ouvir mais e criticar menos, mas no século 21 virou sinônimo de papo furado de networking forçado. O que era uma proposta sincera de conexão virou chavão para coaches de LinkedIn que vivem repetindo frases prontas e sorrisos forçados. Ainda assim, é impossível negar sua influência: milhões aprenderam a falar melhor com colegas e clientes graças a Carnegie. Mas, quando suas lições são reduzidas a slogans vazios e palestras motivacionais genéricas, sobra pouco do seu valor original. Como em toda febre editorial, seu legado hoje é dividido entre quem o lê com admiração e quem o cita como piada pronta em reuniões corporativas.