15 filmes que você só vai assistir uma vez — e vai lembrar para sempre Divulgação / Film1

15 filmes que você só vai assistir uma vez — e vai lembrar para sempre

Bons filmes legam marcas, cicatrizes, memória. São manifestações artísticas que declinam do conforto da repetição, criando uma desordem bastante específica, impossível de ser vivida em todo o seu esplendor e riqueza mais de uma vez e, por paradoxal que soe, isso nada tem a ver com efeitos visuais grandiosos ou reviravoltas mirabolantes: o que há neles é verdade, a mais crua e a mais perturbadora. Esses enredos instigam a reflexão, denunciam iniquidades, avivam as consciências. Processo que quase nunca segue regras, nem observa métodos.

Um exemplo paradigmático desse tipo de cinema é “Johnny Vai à Guerra” (1971), de Dalton Trumbo (1905-1976). O filme é o mais próximo que se pode chegar da sensação de torturante claustrofobia de uma conflagração bélica, descrita sob o ângulo de um soldado que perdeu os braços, as pernas, olhos, ouvidos e boca — mas que continua vivo, consciente. É quase insuportável acompanhar sua tentativa de comunicação com o mundo, enquanto a narrativa nos força a tecer conjecturas sobre o horror do que é apresentado e quão pouco vale a dignidade humana em dadas circunstâncias. Esse é um filme que não se esquece, ao qual precisa-se de coragem para voltar. O incômodo permanece em “O Filho de Saul” (2015), do húngaro László Nemes. Ambientado em Auschwitz, o longa demonstra raro vigor graças a uma câmera que acompanha o protagonista, quase colada à sua nuca, como se quisesse impedir a audiência de perceber outra coisa além de seu sofrimento e sua obstinação silenciosa. O espectador não só assiste: ele é tragado para o epicentro do horror. Falta-lhe o ar. Ao termo dos 107 minutos, o que resta é sobretudo cansaço.

Na era do fast-food cultural, de produções cuja motivação original é agradar o implacável algoritmo, esses filmes impõem-se como monumentos de integridade artística e, por isso mesmo, são inesquecíveis. O que os torna tão singulares é o fato de que não apenas os assistimos: nós os vivemos. Eles permanecem em nossa lembrança, vindo à tona em horas críticas de transformação pessoal urgente. Basta um primeiro contato para o cérebro os registre, e voltamos àquelas imagens em momentos de falta de inspiração, desalento, vontades e desejos absurdos quando tudo parece querer serenar. Além de “Johnny Vai à Guerra” e “O Filho de Saul”, outros treze títulos merecem estar nesta lista. E, claro, que, devem ser vistos e, sim, revistos. Mas, principalmente, lembrados.

Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.