Novo suspense espanhol da Netflix é o melhor filme que você verá neste final de semana Divulgação / Volvoreta

Novo suspense espanhol da Netflix é o melhor filme que você verá neste final de semana

Da mesma forma que não existe crime perfeito, criminosos nunca são iguais entre si. Por mais que se cerquem de métodos semelhantes a fim de alcançar execráveis objetivos, golpistas de toda ordem, estelionatários, ladrões ou assassinos seriais — todos psicopatas em maior ou menor grau —, sempre fazem questão de manifestar em seu comportamento bestial uma característica qualquer que os difira dos outros, como uma impressão digital, e é a partir daí que policiais bem-preparados, ciosos de seu ofício, iniciam suas intrincadas averiguações, logo tornadas um jogo de gato e rato onde as aparências estão sempre muito perto do engano, a verdade irmana-se com a mentira, vilões passam por mocinhos sem inspirar muita desconfiança e o caos é o déspota das ledas intenções do gênero humano, a imperar sobre a lei e a ordem.

Nesta conjuntura em que o homem é o lobo do homem, a vida mais parece uma caçada, cruenta e irracional, em que estamos todos condenados a sofrer nas mãos uns dos outros, sem saber quem é o grande predador. Com “Mikaela”, Daniel Calparsoro demonstra habilidade ao conduzir tramas sobre sujeitos durões que nunca mordem mais do que conseguem mastigar e parecem manter com o perigo uma relação bastante íntima, quase vital. Malgrado não se saia tão bem quanto no ótimo “O Entregador” (2024) ou no surpreendente “Até o Céu” (2020), aqui o diretor prova que um filme pode muito bem navegar por campos diversos, pulando da tensão sem freio para o drama mais intimista, desde que com um propósito certo.

Às vésperas da aposentadoria, Leo Font passa por uma das maiores provações de sua carreira. Uma nevascasem precedentes pega toda a Espanha sem prévio aviso, e em meio ao caos de uma rodovia congestionada, uma quadrilha aproveita a grande chance de investir contra um carro-forte. Perto dali, Leo fica sabendo da ação dos criminosos, e junto com a Mikaela do título, uma oficial novata, tenta impedir que a gangue fuja com o dinheiro, enfrentando também a hostilidade da própria natureza. O roteiro de Arturo Ruiz Serrano dá a Calparsoro um rol de condições para que o diretor faça uma das coisas que melhor sabe e brinque com firulas técnicas na fotografia de Tommie Ferreras e na montagem, a cargo de Antonio Frutos, para, a um só tempo, sublinhar a angústia de Leo e Mikaela e conferir ênfase ao sentimento improvável que vai despontando entre os dois. Antonio Resines, veterano do cinema espanhol, e a jovem Natalia Azahara protagonizam cenas ágeis com a mesma desenvoltura, unidade que conta muitos pontos para que se mantenha crível um mistério que lhes diz respeito. Resines e a bela Azahara ocupam quase toda a hora e meia de projeção; ainda assim, Calparsoro guarda para o desfecho uma reviravolta estimulante, liderada por Cristina Kovani na pele de Ivana.

Filme: Mikaela
Diretor: Daniel Calparsoro
Ano: 2025
Gênero: Thriller
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★
Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.