Autor: Giancarlo Galdino

Um homem reza um Pai-Nosso numa floresta tomada de neve e, sem a menor evidência de um latente prurido moral, alveja um cervo: desde a primeira cena, uma bruma de mal-estar paira sob os “Os Suspeitos”, um dos melhores suspenses da década passada. Aqui, o diretor vale-se de sutilezas de linguagem, diretamente proporcionais ao desempenho dos atores, um dos maiores trunfos do longa, para fazer do roteiro de Aaron Guzikowski uma experiência para muito além do fabuloso.

Num mundo em que redes sociais tornaram-se apenas mero pretexto para se destilar ódio; num tempo em que as pessoas fazem questão de manifestar seu desprezo umas pelas outras; com uma humanidade passiva diante do sofrimento que vem da ignorância em sua forma mais crua, a guerra, ainda faz sentido se falar em bondade.

“Pássaro do Oriente” não se furta a desempenhar esse papel, a do filme-enigma, o que, por óbvio, entedia, aborrece, desgasta, abespinha boa parte dos espectadores, mormente em tempos de uma facilidade ilusória, em que todas as situações, mesmo as fictícias, têm de se resolver a toque de caixa, ou que arque com as consequências de ferir as suscetibilidades de gente que se recusa a crescer e a lidar com as inúmeras frustrações que a vida, essa pândega, lança-nos ao rosto todo santo dia, sejamos ou não capazes de tirar-lhes o pesado véu.