Autor: Eberth Vêncio

Eu devoro a solidão sem sujar as minhas mãos

Eu devoro a solidão sem sujar as minhas mãos

Pode parecer um paradoxo, um conflito interior da maior magnitude, mas, eu não confio em gente que guarda rancor nos cofres da memória. Não minta pra mim, que meu peito não é de aço. Ele não possui chave nem segredo. Também sofro de injustiças, iniquidade e medo. Será que um dia eu cresço? Na minha idade, já devia demonstrar mais equilíbrio. Eu sou aquele carinha desequilibrado, com os dedos a rasgar a própria boca; um homem ignorante, de talento mediano, que escreve para estancar a sede de justiça que lhe seca os sorrisos.

A melhor canção-tema dos filmes de 007 em todos os tempos

A melhor canção-tema dos filmes de 007 em todos os tempos

Sou cinéfilo; não, sifilítico. Porém, nunca fui um especialista em filmes de espionagem, tais como os de 007, mas, mesmo assim, gostava de assistir e digo que Roger Moore foi o meu espião predileto. Deve ser por causa do sarcasmo e do humor negro que ele impingia ao papel, características que eu suponha também possuir. Aquele roteiro manjado do espião charmoso, irresistível, que traçava beldades inimigas ou aliadas, era uma coisa que me interessava em particular, embora eu tivesse na covardia inata uma das minhas marcas registradas.

O amor é contagioso, mas não se pega no cuspe

Declara o elemento, para os fins que se fizerem necessários, que, ao contrário do que se apregoa, a vida não começa aos 40, outrossim, principia quando a gente quiser que ela principie. Nessa altura do depoimento, ele lucubra: Somos livres para ir e vir, para amar e desamar, para levar uma vida inteira na flauta ou à caça do chamado futuro promissor. Ele completa o prolixo raciocínio, com ar de professor, reiterando que o passado o absorve e o presente lhe embrulha o estômago. Anda enojado dos seres humanos, os seus pares cotidianos, como eu, tu, ele, nós, vós, eles.

Por que Deus permite que as mães vão-se embora?

Por que Deus permite que as mães vão-se embora?

Minha mãe tem quase oitenta e fica enfezada, não gosta nem um pouco do jeito desbocado com o qual lhe testo a fé e a paciência. Faço isso de propósito, para atazanar na dose certa, para exercitar os seus neurônios e coronárias. É preocupante: ela anda com lapsos de memória e palpitações. Ela fica furiosa. Então, levanta, vai coar um café a meu gosto: forte e com pouco açúcar. Ela usa um coador de pano encardido, enfiado dentro de um bule surrado que, de tão antigo, parece ter pertencido a Cora Coralina, antes dela se tornar uma poeta famosa.

Viver é esquisito

Viver é esquisito

Não tenho planos de morrer logo, portanto, se tudo correr bem, vou permanecer vivo tempo suficiente para perder vitalidade, definhar, adoecer e arriar de vez, feito a bateria do meu carro. Sim. Viver é esquisito. Mesmo assim e, por causa disso, até mesmo para manter a mente e o corpo minimamente saudáveis e ocupados com tribulações menos inquietantes do que as fatigadoras crises existencialistas, espero trabalhar até morrer ou ficar louco.