58 dias em todas as tevês: filme mais visto de 2023 passou 15 semanas no Top 10 mundial da Netflix Jasin Boland / Netflix

58 dias em todas as tevês: filme mais visto de 2023 passou 15 semanas no Top 10 mundial da Netflix

“Resgate 2”, dirigido por Sam Hargrave, posiciona-se entre as grandes narrativas de ação contemporâneas, espelhando o fascínio que as histórias de super-heróis despertam. O protagonista Tyler Rake, interpretado por Chris Hemsworth, encarna o arquétipo do salvador — um indivíduo com habilidades sobre-humanas e uma determinação inabalável. No entanto, ao longo do filme, o roteiro de Joe Russo subverte essa premissa, questionando o papel e a onipotência desses heróis em meio a tramas que oscilam entre glória e vulnerabilidade.  

Desde a primeira cena, percebe-se que “Resgate 2” não pretende apenas repetir a fórmula do filme de 2020. Embora Rake seja, à primeira vista, um herói imbatível, a narrativa investe na sua fragilidade, criando um protagonista complexo, longe da invulnerabilidade típica. A jornada de Tyler é marcada por pequenas vitórias, muitas vezes à beira do fracasso, como se cada momento de sobrevivência fosse sua única recompensa. O contraste entre suas conquistas modestas e o fardo monumental que carrega oferece uma perspectiva mais humana e crua, enriquecendo o caráter do anti-herói.  

Essa transformação é cuidadosamente trabalhada através dos flashbacks, onde Hargrave reacende as dúvidas sobre a índole de Rake, mantendo o espectador em constante ambiguidade moral. Nik Khan (Golshifteh Farahani) surge como uma presença vital, e sua expressão, iluminada pela fotografia dourada de Greg Baldi, transmite o peso do passado e o temor pelo futuro. Mesmo ao lado de um mercenário que deveria ser indestrutível, sua apreensão é palpável, reforçando o tom sombrio e instável da trama.  

A evolução narrativa de “Resgate 2” vai além da ação superficial. Joe Russo introduz, de forma incisiva, o instinto paternal de Rake, uma camada emocional que o separa dos tradicionais heróis truculentos. Embora esse elemento tenha sido explorado no filme anterior, aqui ele assume um papel central, especialmente nas sequências que antecedem o clímax. O herói, outrora invencível, agora depende de outros para sobreviver, e a exaustiva espera por sua recuperação é permeada por uma incerteza latente, tornando cada minuto um lembrete da fragilidade humana.  

A sequência ambientada em Dubai reforça a aura de Rake como um “super-homem nietzschiano”, enquanto a ação se intensifica em cenários globais. A cadência da narrativa culmina no confronto de um trem desgovernado, onde Tyler e Nik enfrentam uma verdadeira legião de inimigos. A luta não é apenas pela sobrevivência, mas pela afirmação de que, mesmo diante de forças avassaladoras, ainda existe esperança.  

Pankaj Tripathi, no papel do chefão do crime Ovi Mahajan, adiciona camadas de tensão ao trazer de volta o legado da missão fracassada em Mumbai. Relembrando os eventos traumáticos que uniram Rake e Nik, o filme estabelece uma conexão emocional que transcende a violência, explorando o peso das decisões passadas e a necessidade de redenção.  

Hargrave, porém, não se limita à ação desenfreada. Ele mergulha na misantropia dos personagens, contrastando a brutalidade externa com as prisões internas que os assombram. Tanto Rake quanto Nik carregam cicatrizes que vão além do físico, criando uma promessa de felicidade inatingível, sugerida ironicamente pelo vilão interpretado por Idris Elba.  

Enquanto o filme encerra deixando pontas soltas e uma expectativa para a próxima etapa dessa caçada, “Resgate 2” já consolida sua posição como uma análise profunda do que significa ser herói em um mundo onde não basta apenas sobreviver — é preciso encontrar um propósito maior.

Filme: Resgate 2
Diretor: Sam Hargrave
Ano: 2023
Gênero: Ação/Thriller
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★