Para aqueles que apreciam histórias carregadas de ação ininterrupta, regadas a cenas violentas e marcadas por confrontos entre figuras moralmente dúbias, “Através das Sombras” é uma escolha certeira. A assinatura do diretor indonésio Timo Tjahjanto é evidente: ele cria uma trama onde os personagens, em meio a dilemas morais profundos, são empurrados para situações que desafiam suas noções de certo e errado, sem nunca deixar o ritmo esfriar. As narrativas de Tjahjanto sempre envolvem protagonistas que, diante de um evento inesperado, são obrigados a repensar seus rumos, mas sem que isso diminua a intensidade dos conflitos físicos e éticos. Aqui, ele constrói uma história tensa, onde os personagens vivem no limite, tentando equilibrar-se entre o submundo violento do crime e a busca por alguma forma de redenção. No entanto, não espere que esses anti-heróis cheguem a algum tipo de transformação definitiva antes que o filme tenha avançado significativamente, já que a jornada é longa e intensa, com quase duas horas e meia de duração.
No centro dessa trama distópica, um grupo clandestino que age nas sombras está disposto a executar qualquer vingança pelo preço certo. Esse grupo, sem qualquer laço com a moralidade convencional, encontra no caos e na violência uma espécie de refúgio. Tjahjanto, como já demonstrara em seus filmes anteriores, como “Headshot” (2016) e “A Noite nos Persegue” (2018), constrói uma narrativa que flerta constantemente com a ambiguidade moral, onde a fronteira entre o bem e o mal é nebulosa e incerta. O filme começa de forma explosiva no Japão, com uma chacina orquestrada por uma misteriosa figura em trajes negros, a Agente Treze, uma jovem de apenas dezessete anos, mas já a mais implacável assassina de sua gangue. Aurora Ribero, que interpreta Treze, domina as cenas de luta com uma presença avassaladora, empunhando seus sabres com uma destreza quase coreográfica, enquanto a violência toma conta da tela. A construção de Tjahjanto é cuidadosa, levando a história para seu clímax de forma gradual, mas sempre com a ação pulsando.
A narrativa então se desloca para o sudeste asiático, especificamente para uma floresta no Camboja, onde Treze encontra Monji, um menino de onze anos que guarda um segredo valioso e é perseguido por diversos grupos, inclusive pela gangue Sombras. Após a morte da mãe do garoto, Treze, em um ato inesperado de compaixão, decide protegê-lo, tornando-se sua guia e guardiã. É nesse momento que a trama ganha uma nova camada emocional, com Treze revelando um lado mais humano e maternal, algo que se contrasta com sua postura fria e letal nas batalhas. A química entre Aurora Ribero e o jovem ator Ali Fikry é um dos pontos altos do filme, criando uma dinâmica que equilibra a ação frenética com momentos de interação mais sutis e tocantes. Esse equilíbrio, entre a brutalidade das cenas de luta e a relação afetiva que se desenvolve entre Treze e Monji, dá ao filme um ritmo envolvente, culminando em um desfecho que, embora sentimental, evita cair no melodrama.
Com “Através das Sombras”, Tjahjanto se afasta um pouco do modelo tradicional de protagonistas masculinos e brutamontes, optando por colocar mulheres no centro da ação. Aurora Ribero não só cumpre as expectativas, como brilha em cenas de combate impecavelmente coreografadas, enfrentando adversários de forma intensa e convincente. Porém, é a relação da personagem com Monji que realmente dá alma à trama, oferecendo uma profundidade emocional que complementa a violência estilizada que permeia o filme. Combinando a estética característica do novo cinema de ação da Indonésia com uma narrativa que explora tanto os aspectos físicos quanto os emocionais de seus personagens, Tjahjanto entrega um filme que, embora recheado de cenas de luta impressionantes, não se perde no excesso, mas constrói uma história coesa, intensa e impactante, onde cada escolha carrega consequências, e cada personagem está à beira de uma transformação inevitável, mas dolorosa.
Filme: Através das Sombras
Direção: Timo Tjahjanto
Ano: 2024
Gêneros: Ação/Crime/Suspense
Nota: 9/10