Visualmente magnífico, o filme de língua não inglesa mais assistido na história da Netflix Divulgação / Netflix

Visualmente magnífico, o filme de língua não inglesa mais assistido na história da Netflix

Em momentos raros, quando nos desvencilhamos das facilidades da vida moderna e olhamos para o âmago de nossa existência, descobrimos em nosso ser algumas respostas que, sem saber, buscamos desde o primeiro encontro com o mundo. Essa busca, alternando entre loucura e uma lógica assustadora, assemelha-se à jornada errante de um poeta final, preso em suas ilusões vãs, degustando o beijo etéreo de um anjo enquanto atravessa um arco-íris, ansiando pelo ouro que parece nunca alcançar. O ser humano, conhecido por almejar o inatingível, mesmo quando se aproxima de seus desejos, invariavelmente encontra uma maneira de destruir suas próprias aspirações, como se estivesse comprometido com o fracasso, incapaz de se encantar com a perspectiva da felicidade, de reconhecer-se como uma criação falha, sim, mas também repleta de mistérios gloriosos, que o tornam tão especial e singular justamente por suas imperfeições sublimes.

Talvez o homem seja, por natureza, incapaz de alcançar a felicidade, seja por falta de dedicação ou de aptidão. Apesar das falhas morais da humanidade, a natureza, da qual fazemos parte, só deseja rugir, alto o suficiente para nos despertar do entorpecimento em que nos escondemos quando florestas antigas como o tempo ardem em fogos clandestinos ou se transformam em assoalhos nas mansões dos poderosos ignorantes; quando uma nova espécie se junta à longa lista de animais ameaçados de extinção; quando o solo se fende pela falta de água, incapaz de formar as nuvens que trariam a chuva salvadora; ou quando a água, em si, adoece, vítima das ações humanas em nome do que chamam progresso, mas que se fundamenta em métodos ultrapassados e ineficazes, prejudiciais tanto ao ambiente quanto ao próprio homem, sempre rápido em inventar desculpas esfarrapadas para justificar sua negligência.

O cineasta norueguês Roar Uthaug parece ter encontrado um nicho inexplorado em seu trabalho. Utilizando-se do folclore pouco conhecido fora de sua Noruega natal, “O Troll da Montanha” surge como um grito urgente da Terra, encarnado em uma criatura monstruosa que, mais do que atacar, busca defender-se. O roteiro de Uthaug e Espen Aukan, à primeira vista, pode parecer destinado apenas a entreter um público acostumado com narrativas escapistas, sem atentar para as mensagens sociais e filosóficas — como as contidas em “King Kong” e “Godzilla” —, mas a direção firme de Uthaug guia a trama em uma direção clara desde o início. A paleobióloga Nora Tideman, vivida por Ine Marie Wilman, faz uma descoberta de grande importância: um fóssil de dinossauro que tem sido objeto de acaloradas e infrutíferas discussões científicas. Uthaug constrói cuidadosamente o cenário para a reviravolta da história, incluindo a implosão de uma área da montanha onde as escavações ocorrem, momento em que o ser antropomórfico, um colosso de pedra e líquen mencionado no título, começa a dominar a narrativa.

Para compreender a verdadeira natureza da criatura libertada, Nora recorre ao pai, Tobias, um homem longe de ser moralmente exemplar ou mentalmente estável. O personagem de Gard B. Eidsvold traz a excentricidade necessária em uma obra densa e quase impenetrável, mas o desenvolvimento desse arco é crucial para a compreensão do tema central, culminando em uma sequência tocante em que o troll revela uma sensibilidade inesperada, superando a de muitos humanos.


Filme: O Troll da Montanha
Direção: Roar Uthaug
Ano: 2022
Gêneros: Terror/Ação/Suspense
Nota: 8/10