O melhor filme francês da história da Netflix K. Kourtrajme / Netflix

O melhor filme francês da história da Netflix

Em um filme que à primeira vista pode parecer simples, Romain Gavras revela uma complexa reflexão sobre as relações conflituosas e intrincadas que moldam o mundo de homens diferentes entre si, mesmo que não tenham um perfil belicoso e preferissem evitar conflitos. “Athena”, seu trabalho recente, é uma crônica impactante sobre a vida nos subúrbios de Paris, focando-se em narrativas densas que não visam a condenar vilões nem a eleger heróis sacrificiais.

Gavras, sem receio de abordar o óbvio, revela as camadas e complexidades subjacentes que muitas vezes o acompanham. Esta abordagem, que evita conotações explicitamente políticas, proporciona uma visão esclarecedora sobre os desafios enfrentados por uma juventude desorientada pela desordem sociopolítica contemporânea, um problema global. Este cenário apocalíptico, desprovido do glamour da ficção científica, nos assombra, mascarado com as vestes de um passado vergonhoso.

O diretor opta por iniciar seu longa-metragem com um plano-sequência que expõe de forma visceral a inadequação e surpreende o espectador. Abdel, um militar desiludido, está envolvido na investigação de mais um caso de violência policial contra indivíduos não-brancos, majoritariamente argelinos e marroquinos, no distante bairro de Athena, longe do brilho turístico e boêmio de Paris. A diferença desta vez é que a vítima é Imir, seu irmão mais novo, de apenas treze anos.

O roteiro, escrito por Gavras, Elias Belkeddar e Ladj Ly, está repleto de evidências que acusam a polícia, fornecendo ao público uma visão clara dos culpados. Este é o ponto de partida para explorar a ambiguidade do personagem de Benssalah, um homem atormentado, e seu desempenho brilhante se destaca na sequência em que enfrenta a comunidade furiosa em uma coletiva de imprensa.

Durante a tentativa de transmitir as desculpas oficiais, um coquetel molotov é lançado em sua direção, revelando a profunda divisão e a dor interna de Karim, interpretado por Sami Slimane, parente da vítima que, paradoxalmente, parece estar em conflito com o que seria esperado dele. A expressão de desespero em seus olhos é uma das cenas mais poderosas do filme.

“Athena” é repleto de longas tomadas, quase extenuantes, que conferem à narrativa uma qualidade épica, reminiscentes do estilo de Costa-Gavras, pai do diretor. O enredo, embora familiar, é redimido por esses detalhes artesanais que deram ao filme uma recepção calorosa no Festival de Veneza. Esta atenção aos detalhes transforma uma história comum em uma experiência cinematográfica memorável. O bom cinema, às vezes, reside na simplicidade complexa de uma narrativa bem construída.


Filme: Athena
Direção: Romain Gavras
Ano: 2022
Gênero: Drama/Ação
Nota: 9/10