A lista de leituras dos BBBs confirma que o poço não tem fundo e que, às vezes, um pirulito é maior do que um cérebro

A lista de leituras dos BBBs confirma que o poço não tem fundo e que, às vezes, um pirulito é maior do que um cérebro

Nos últimos anos, um dos meios de entretenimento abraçados por nós, brasileiros desvairados, foi o tal do podcast. Basicamente, consiste ele em um espaço de troca de ideias, em que um ou mais apresentadores — denominados “hosts”, uma vez que nutrimos simpatia pelas palavras não aportuguesadas — direcionam seus convidados a detalhar situações de suas vidas de maneira confortável e descontraída. Desses locais interessantes, muitas ex-celebridades ressurgiram das cinzas, bem como houve a consagração de pessoas sem um mínimo de coordenação em suas sinapses. Um deles, inclusive, considera-se como um exilado político. Quá-quá!

E se estamos no âmbito das subcelebridades, nada mais justo do que o divertimento oriundo do infindável Big Brother Brasil. Em sua vigésima quarta edição (!), o programa da rede platinada reuniu uma line-up invejável, do jeito que o brasileiro médio gosta: gente com claros distúrbios de convivência e muita futilidade barata. Acompanhar o dia a dia dos brothers, aliás, é municiar sua importância perante as rodas de conversas atuais; caso você esteja por fora dos acontecimentos da casa, esqueça a interação. É assistir ou assistir, não há jeito ou escapatória. E se existe esse palco propício para as melhores discussões sobre nadas, o certo é embeber a mente na novela da vida real e desfrutar das aventuras dos participantes.

Pois bem. Para além de amenidades sobre pessoas “padrão”, a grande contribuição ou legado tanto dos podcasts quanto desta edição do BBB é o incentivo à leitura de qualidade. Em um e em outro, os convidados e participantes desatinam sem dó e se orgulham dos seus livros de cabeceira, com a volúpia dos que estão certos de que aconselham as massas a conhecerem novos desafios mentais. E a lista de autores, cujas obras possuem a mesma profundidade do estudo que os hosts fazem quando recebem convidados ilustres, é sublime. Em um episódio recente de um podcast, exempli gratia, um ator de um consagrado filme nacional policialesco se disse amante da ciência verdadeira.

E para refutar o que sói ser consolidado pelo que ele aponta como “o sistema”, citou estudos científicos sérios acerca de ETs, sociedades avançadas do Mato Grosso do Sul, moedas feitas por alienígenas e uma série de conspirações que valem a pena assistir. Tudo isso garantido por sua leitura de qualidade, que envolve os maravilhosos fóruns de conspirações da internet mundial. Se você quer destruir a sua sanidade, é indispensável.

Tanto esse cidadão de bem quanto uma das participantes do atual Big Brother têm uma diferenciação afim: são leitores inveterados. E isso os torna, por óbvio, grandes expoentes da divulgação da intelectualidade contemporânea. Afinal de contas, ler deve fazer parte do cotidiano do brasileiro — e discordar disso é fanatismo. Essa influenciadora citada, por sinal, que, a despeito do auge de ter seus milhões de seguidores nas redes sociais, foi humilde o suficiente para expor que se debruçou sobre compilados de vocábulos no proximal interstício de apenas um ano. Curiosamente, sua homônima no programa, filha de um cantor famoso, incentivou pessoas a lerem uma obra considerada marco da contracultura: “A Sociedade do Espetáculo”, de Guy Debord; ela, por sua vez, apresentou um repertório de “clássicos” da lista de mais vendidos de uma famosa revista de circulação nacional. Todos, claro, extremamente monotemáticos: autoajuda, seja qual ela for. Advinha qual das indicações fez um alvoroço nas vendas imediatamente?!

Podcasts e o Big Brother são agora parte de nossa cultura. Assim como o futebol, o jeitinho malicioso, o furto de transeuntes, a saidinha bancária, a falta de empatia, o cancelamento, o golpe do pix e o brigadeiro. E não podemos deles nos desvencilhar. Ainda mais agora, com novéis cultos, que apreciam a verdadeira arte da escrita e fazem divulgação de obras extremamente valorosas, tais quais as que consolidam mentes milionárias ou alteram o nosso conturbado mindset — ô povo que curte esses termos dos nortistas, viu?!

O jeito é sentar-se à mesa do quarto, ou aproveitar o restinho de sono, para assistir, com muita atenção, às nossas produções artísticas de conteúdo imprescindível. Um salve e um viva aos importadores desses dois produtos de transformação dos brasileiros. E descansem em paz, Machado e companhia limitada.