Premiado em 5 continentes, drama que recebeu aplausos de pé em Cannes, é uma das obras-primas da Netflix Divulgação / Dulac Distribution

Premiado em 5 continentes, drama que recebeu aplausos de pé em Cannes, é uma das obras-primas da Netflix

“1976”, a obra de Manuela Martelli, não é apenas uma narrativa sobre a ditadura de Pinochet no Chile; é também um estudo sobre a resiliência e adaptação humanas diante de circunstâncias extraordinárias. Através da lente de Carmen, interpretada com uma profundidade emocional por Aline Küppenheim, o filme desvenda como a vida sob um regime autoritário se infiltra nas esferas mais íntimas e pessoais, alterando a realidade cotidiana de maneira irreversível.

Carmen, uma figura da alta sociedade chilena, inicialmente parece distante dos conflitos políticos que fervilham ao seu redor. No entanto, à medida que o filme avança, ela se vê cada vez mais enredada nas malhas da política nacional, uma transformação que reflete não apenas a sua jornada pessoal, mas também a de muitos cidadãos que se viram forçados a confrontar uma realidade política hostil. O filme habilmente navega pelos desafios de retratar uma personagem complexa, que se equilibra entre a apatia inicial e uma crescente consciência política.

Martelli, com um olhar agudo, evita cair na armadilha de simplificar ou romantizar a história. O roteiro, uma colaboração entre ela e Alejandra Moffat, é construído com cuidado, tecendo uma narrativa que ressoa com autenticidade e veracidade. A direção de Martelli é calculada, focando em contar a história de Carmen com uma sensibilidade que permite ao espectador se conectar emocionalmente com a personagem e o contexto histórico.

A trilha sonora de Mariá Portugal e a cinematografia de Soledad Rodríguez são componentes fundamentais que enriquecem a experiência do filme. Eles trabalham em conjunto para criar uma atmosfera que captura a tensão e a ambiguidade moral da época, sem jamais sobrecarregar a narrativa principal. Os figurinos, por sua vez, não são apenas elementos de estilo, mas também peças-chave na construção da identidade de Carmen, refletindo as mudanças internas e externas que ela experimenta.

Este filme também atua como um reflexo da história política e social mais ampla da América Latina, uma região historicamente marcada por golpes de Estado e regimes autoritários. “1976” é um lembrete pungente de como a política pode invadir e transformar o pessoal, um tema que ressoa não apenas no contexto latino-americano, mas em todo o mundo.

Martelli, em seu primeiro longa-metragem, demonstra um entendimento profundo dos temas abordados, tratando-os com a seriedade e profundidade que merecem. O filme, apesar de suas limitações, oferece uma visão singular e valiosa sobre uma era definida por conflitos e resistência.

Assim, “1976” se estabelece como uma peça cinematográfica de valor inestimável para o cinema latino-americano. O filme não apenas conta a história de uma mulher e sua transformação, mas também serve como uma janela para um momento crucial na história, destacando a interação entre a vida pessoal e os grandes movimentos sociais e históricos. Ele mostra como, mesmo em tempos de repressão e medo, a humanidade pode encontrar maneiras de resistir, adaptar-se e, em última análise, triunfar sobre a adversidade.


Filme: 1976
Direção: Manuela Martelli
Ano: 2022
Gênero: Drama/Suspense
Nota: 10/10