Joan Chemla é uma cineasta francesa por trás de alguns curtas aclamados pela crítica e que fez sua estreia em longas-metragens em 2017, com “Se Você Visse o Seu Coração”, drama expressionista com Gael García Bernal. É como se muita coisa acontecesse na vida de seu protagonista, Daniel, um rapaz marginalizado e que após a morte de um amigo se vê rejeitado em sua comunidade cigana no interior da França.
Apesar de tantos eventos traumáticos em sua não tão longa existência, a forma como a história é contada, a edição que dá forma ao filme, faz parecer que a trama é lenta e arrastada. Mesmo assim, há uma profundidade na narrativa, que é seu ponto forte. Chemla consegue demonstrar o poder de sua história por meio de sua força dramática e poética.
Agora apenas mais um miserável no mundo dividindo um cubículo no Hotel Metropole com outro miserável, Daniel pratica alguns golpes em idosos e se envolve com outros marginais. Em uma existência que se aproxima do medíocre, ele parece afundar em um abismo de escuridão. Até que conhece Francine (Marine Vacth), uma mulher belíssima e mais nova inquilina daquela pensão encardida e abarrotada de delinquentes. Recém-saída de uma clínica psiquiátrica, Francine é física e emocionalmente frágil. Ela acredita que Daniel seja uma espécie de anjo que veio ao seu resgate, mas, na realidade, é ela que o está puxando de volta para a vida.
Fragmentos de memória mostram como foi a morte do amigo de Daniel, Costel (Nahuel Pérez Biscayart), horas depois de seu casamento. Embora Daniel não tenha feito absolutamente nada que provocasse a tragédia, o fato de ter testemunhado e, talvez, sua incapacidade de tê-la evitado o transforma em um maldito em sua pequena comunidade.
Com uma fotografia inebriante que ora paira sobre o prado amarelado e ora repousa em forma de sombras e luzes que adentram timidamente as frestas da janela do quarto de Daniel, a estética belíssima do longa de Chemla nos dá uma sensação justaposta de carnal e etéreo. Sua tonalidade pastel, com cores marrons e avermelhadas, reforça emoções como a raiva e o ressentimento. Mas são os jogos de luzes que fazem tudo parecer, ao mesmo tempo, transcendental ou onírico.
A atuação impiedosa de Gael Garcia Bernal faz com que nos rendamos aos olhares naufragados em lágrimas de Daniel ao falar sobre o amor por Francine, a última esperança de um homem vencido pela vida fadada à desgraça e ao fracasso, ou sua expressão abatida e solitária enquanto perambula pelos corredores da pensão e pelas ruas da cidade.
Chemla, com certeza, foi bastante pretenciosa e corajosa em infundir suas ideias nessa produção incomum que desperta sensações contraditórias em quem assiste. Você pode amar ou odiar, dependendo do seu gosto ou do seu estado de espírito. O que é inegável é que “Se Você Visse Seu Coração” é tão parado e complexo, que a gente se pega em alguns momentos pensando nos boletos ou olhando no relógio. É um drama lânguido, que pendula entre a belo e o abstrato.
Inspirado no romance do autor cubano Guillermo Rosales, “Boarding Home”, o longa demanda disposição e sensibilidade.
Filme: Se Você Visse o Seu Coração
Direção: Joan Chemla
Gênero: Drama/Policial
Ano: 2018
Nota: 8/10