A violência das grandes cidades neste século 21 é de tal forma bárbara e imanente, alcançando todos os estratos sociais, todas as idades, todas as culturas que, por mais cruento que um filme seja, nem sempre isso se torna motivo para escândalo. A atrocidade da maioria das cenas de “Massacre no Texas” por si só é sintoma das profundas mudanças às quais o cinema e forçado a se submeter de tempos em tempos, satisfazendo a necessidade mórbida de certo público de exorcizar suas feras. O terror assumidamente questionador e arreganhado dos franceses e Alexandre Bustillo e Julien Maury veste-se com as roupas de alguma crítica social a fim de tecer seus comentários acerca da decrepitude emocional de uma família, alastrando-se como um câncer por toda uma pequena cidade, e o resultado é uma caçada em que delinquentes bebem o sangue uns dos outros e avançam também sobre inocentes, valendo-se de um instrumento bastante ameaçador.
O roteiro de Seth M. Sherwood se assume repulsivo desde sempre, e brinca com todos os clichês do slasher, as histórias sobre assassinos perversos que matam sem saber muito bem por que, largando um rio de sangue por onde passam. E é no seio de uma família excêntrica, como tantas outras, que tem início o grande drama que sustenta o enredo. Bustillo e Maury reservam para o final para a explicação para o uso da máscara de couro do vilão, mas a manutenção do segredo por toda a hora e meia que dura o longa não interfere no show de horrores que se assiste até o derradeiro instante. Um menino está fazendo aniversário e canta os parabéns ladeado pelos parentes. Ele sopra as velas, faz um desejo em silêncio e a ação corta para um homem amarrado numa cadeira, como ja prevendo o que há de lhe suceder. A família de bestas autoprotetoras chefiada por Verna Sawyer encerra-se em si mesma na choupana que a fotografia de Antoine Sanier deixa assombrosamente escura, e transcorridos dez anos Jed, de Boris Kabakchiev, aquele menino talvez doce até então, degenera num matador inescrupuloso, que atrai casais excitados para armadilhas letais. Lili Taylor, onipresente na imundície moral da trama do começo ao fim, confere a sua personagem a substância dramática que torna verossímil a maldade que rege seus filhos, e Jed vai acusando o golpe, até ir parar no hospício local. No Texas de 1955,
Verna era considerada uma mulher ainda mais impertinente para os padrões contemporâneos, sem medo inclusive de peitar o diretor do manicômio para obter a soltura do filho. Esse talvez seja o pulo do gato em “Massacre no Texas”: compreender a intrincada relação maternal da vilã de Taylor numa narrativa abjeta, mas envolvente, que emula o horror em H.P. Lovecraft (1890-1937), Edgar Allan Poe (1809-1849) e Stephen King, e o funde ao ultrarrealismo que só cinema tem mesmo.
Filme: Massacre no Texas
Direção: Alexandre Bustillo e Julien Maury
Ano: 2017
Gêneros: Terror/Suspense
Nota: 7/10