O filme mais assistido da atualidade em 125 países está na Netflix Doane Gregory / Netflix

O filme mais assistido da atualidade em 125 países está na Netflix

Criar filhos talvez seja a maior aventura a que alguém pode se lançar, e por eles decerto se aprende que há sempre uma vasta chance de tornar um pouco mais elástica a fronteira do que se pode tolerar ou não. A mãe a que o título do filme da neozelandesa Niki Caro refere-se não abdica de uma carreira duvidosa — e ainda que não o fizesse, não adiantaria muito —, mas aceita com alguma resignação o destino de virar uma exilada em sua própria vida, pária a reboque do que deliberam sem sua licença, e, pior, trânsfuga de confrontos em que é implicada sem querer. Caro sai de um ponto bastante genérico até aproximar-se, lentamente, do objeto de seu trabalho, qual seja, o laço desfeito de duas pessoas que não deveriam separar-se, momento em que o cerco se fecha incontornavelmente.

Pelo amanhecer lúgubre em tons profundos de azul no subúrbio tranquilo de Linton, Indiana, no centro-oeste americano, não se pode conhecer direito o que uma casa de padrão médio tem de extraordinário. Trata-se de uma base do FBI que investiga o tráfico de armas por uma quadrilha internacional liderada por Adrian Lovell e Hector Álvarez, os chefões do submundo encarnados por Joseph Fiennes e Gael García Bernal, particularmente hábeis em fugir do acossamento da polícia federal dos Estados Unidos. O agente William Cruise, de Omari Hardwick, bota a fita 703 para rodar, às seis e catorze da manhã, e começa o interrogatório. Cruise pergunta sobre metralhadoras soviéticas PKM, minas terrestres M18 e lança-foguetes de origem desconhecida à cativa que mantém sob sua tutela, até que o que parecia inevitável, enfim, acontece.

A introdução, como se obedecesse ao curso de uma arma de guerra, deixa o espectador atônito com tanta ação e tantos detalhes por minuto, e o roteiro de Andrea Berloff, Misha Green e Peter Craig se conserva tenso, aproveitando bem as possibilidades de evolução de aspectos secundários da trama até o final. A mãe sem nome de Jennifer Lopez é caçada por saber demais, e mesmo sob a custódia do Estado, está em perigo. Isso fica claro no momento em que Álvarez chega à sorrelfa, exatamente como dissera que iria ocorrer, e faz chover sobre ela e o personagem de Hardwick uma troada de chumbo grosso, que vitima com gravidade o policial. Quanto à Mãe, o ataque do vilão de Bernal, aparecendo de modo bissexto e sem muita firmeza, Caro já abre nessa sequência o segredo de polichinelo a unir Álvarez à anti-heroína de Lopez, momento em que o filme começa a fazer sentido.

Até o encerramento, “A Mãe” é uma sucessão bem levada de cenas rápidas, vigorosas, pródigas dos lances inauditos em que Lopez exerce a versatilidade que define seu trabalho no cinema. A esperança de romance com Cruise perde velocidade a medida que Zoe, a verdadeira mocinha, de Lucy Paez, mostra a que veio, e tudo fica tanto mais sensato com a fotografia precisa de Ben Seresin, que conserva a atmosfera noir do prólogo. 


Filme: A Mãe
Direção: Niki Caro
Ano: 2023
Gêneros: Mistério/Aventura
Nota: 8/10