O filme delirante e insano da Netflix que provoca reações extremas no espectador Lilja Jonsdottir / Netflix

O filme delirante e insano da Netflix que provoca reações extremas no espectador

Primeira produção original Netflix islandesa, “Contra o Gelo” é uma realização de caráter biográfico e que foi filmada nas condições mais insalubres possíveis. Propositalmente? Sim e não. Na realidade, a produção queria o mínimo de CGI e o máximo de realismo nas cenas, o que tornou a experiência do elenco e de todos envolvidos muito desafiadora. Gravado parte na Islândia e parte na Groenlândia, no extremo norte do globo, todos que trabalharam para concluir essa obra estiveram expostos ao frio congelante e às condições ambientais inclementes.

O filme remonta a missão liderada por Ejnar Mikkelsen (Nicolaj Coster-Waldau) para encontrar os corpos de Ludwig Mulius-Erikssen e outros integrantes da Expedição Dinamarquesa, contratada para mapear a costa nordeste da Groenlândia para demarcação de território. Graças à expedição, foi descoberto que o Canal Peary, um hipotético braço do Oceano Ártico, não existe. No entanto, também foi descoberto que toda a tripulação da expedição morreu congelada. Após diversas buscas pela equipe de Ejnar, grande parte dos homens retornou aos Estados Unidos, enquanto apenas ele e o mecânico Iver Iversen insistiram nas buscas.

O enredo é puro sofrimento, luta pela sobrevivência e insanidade. Mikkelsen e Iverson (Joe Cole) atravessam as mais duras penitências para descobrir o que precisam. Mas as mazelas da vida exploratória teve lá seus galardões. Afinal, não só de fins malfadados viveram os antigos cartógrafos, astrônomos, marinheiros e viajantes. Sem suas históricas missões, jamais teríamos algumas transformações importantes, como as rotas marítimas, o capitalismo, a evolução da tecnologia e a globalização. Claro que também houve muitos contras para além destes prós, como o genocídio do povo indígena, a exploração mineral, o desmatamento, o aquecimento global e várias outras coisas péssimas que, ao mesmo tempo que nos conduzem para o futuro, nos condenam.

Na fotografia de cor fria de Torben Forsberg, que explora as paisagens de infinitas e estonteantes geleiras no Ártico, o espectador sente, assim como Mikkelsen e Iversen, a solitude e a pequenez da vida. Em suas mulheres imaginárias, que inventam a partir de uma foto, reside a esperança para sobreviver apesar dos constantes perigos e das desventuras. À beira da loucura, Mikkelsen acredita que Iversen teria dormido com Naja, que não passa de um fantasma de um antigo amor com quem ele se encontra às vezes para desabafar. Iversen sequer conhece a pessoa real, quem dirá o espírito.

A cada cena somos tomados de angústia e de claustrofobia. Também do desejo de nos libertamos daquelas profundas camadas de gelo que cercam os protagonistas. Waldau, que começa sua atuação como um frio e experiente explorador, impaciente com o companheiro amador e falante Iversen, termina como um homem vulnerável e tomado de loucura, que depende de seu colega inexperiente para sobreviver. Enquanto isso, Cole como Iversen transparece a evolução e amadurecimento de seu personagem. Primeiro, como um jovem deslumbrado, depois como um farol de equilíbrio a guiar seu mentor.


Filme: Contra o Gelo
Direção: Peter Flinth
Ano: 2022
Gênero: Biografia / Aventura
Nota: 9 /10