15 filmes na Netflix que valem 100 vezes mais do que 100 dias de Big Brother

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A necessidade de se autoafirmar, de saber que está no caminho certo — por mais que sua intuição lhe sopre a verdadeira resposta, que só seu próprio coração conhece — assalta a natureza humana de tempos em tempos desde sempre. Animal gregário (e sentimental), o homo sapiens precisa de aprovação, temos que ter certeza de que estamos agradando. A menor hipótese de decepcionar aqueles que julgamos caros nos apavora, e termina por nos empurrar para alguma forma de isolamento, outro dos tantos paradoxos da condição do homem, que tenta se livrar do jugo do fracasso desenvolvendo estratégias de poder seja lá em que medida e com que propósito. Tão perdidos estamos no mundo que nos julgamos mais inteligentes, mais especiais, superiores a quem está ao nosso lado, partilhando das mesmas fraquezas e usufruindo de iguais pequenos sucessos — e que, mais do que isso, muitas vezes conhece nossas carências tanto como nós mesmos. Cada vez mais assoberbado de trabalho e, por conseguinte, das tantas coisas que inventa dia após dia e sem as quais acha que não pode mais viver, o homem do século 21 é um escravo de si mesmo, arrastando os grilhões da falta de amor-próprio, da vaidade, da vontade oca de se destacar mesmo que sem nenhum mérito.

Liberdade é uma das maiores conquistas da civilização. Desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos, promulgada em 10 de dezembro de 1948, ao nascer, cada indivíduo torna-se um ente que conta com a proteção do Estado, dos governos, da sociedade em que passa a viver e de seus congêneres — ao menos na bonita teoria. Na vida real, o que se vê é muita gente ganhando fortunas precisamente às custas de quem tem menos, o que degringola num processo de vale-tudo em que a vida humana é precificada e só tem valor aquele que dispõe de alguma coisa palpável para mostrar. Por esse motivo, passamos a disputar uns contra os outros a fim de garantirmos nosso lugar na próxima etapa do jogo, sem nos importarmos com detalhes como ética, solidariedade, piedade e mesmo razão. O que interessa é vencer custe o que custar, e essa visão de mundo, a da vitória como fim último da existência, é alimentada em seu apetite voraz por certos programas de televisão, que patrocinam o pior da alma humana: a barbárie, a vontade de se dar bem sem que se meçam as consequências, o pouco caso com o outro, a miséria intelectual. A Bula preparou uma lista com quinze títulos que, em maior ou menor proporção, aludem a esses desvios espirituais, seja no que diz respeito à sanha por poder, seja no que fala mesmo às circunstâncias de se encontrar apartado do convívio social mais amplo. “O Quarto de Jack” (2015) é, decerto, o que mais se aproxima da proposta de confinamento desses shows nada reais, uma vez que no filme dirigido por Lenny Abrahamson a personagem central e seu filho passam cinco longos anos imprensados num cômodo diminuto, criminosamente encarcerados por um algoz patologicamente débil. Por outro lado, quem aceita esquecer da vida e ter os hábitos mais comezinhos registrados pela lente de câmeras que os projetam para toda a parte deve estar ciente de que irá despertar sentimentos os mais disparatados, em especial os pouco nobres, experiência tão nova que mesmo os participantes das primeiras edições desses programas não vivenciaram. Em “Rede de Ódio” (2020), o polonês Jan Komasa aborda a capacidade destrutiva das novas tecnologias, a serviço tanto da evolução como do atraso e da violência. “O Quarto de Jack”, “Rede de Ódio” e os outros treze filmes da nossa relação, elencados do mais recente para o mais antigo, todos na Netflix, reafirmam a importância do cinema como um veículo de vanguarda quanto a pensar os grandes problemas do homem, se adiantando a outras questões. Há quem prefira a burrice, todavia, mas esse é assunto para uma próxima coluna.

Imagens: Divulgação / Reprodução Netflix