A seleção anual de livros de 2025 se apoia em dois conjuntos de votos. Um deles vem de 30 convidados — escritores, jornalistas, editores e leitores — que indicam obras publicadas no Brasil em 2025, separadas em nacionais e internacionais. Esta suíte reúne apenas os internacionais. Entre esses 30 convidados, 27 indicaram ao menos um livro internacional. O outro conjunto vem de 100 leitores da newsletter, chamados a indicar um livro internacional; nessa etapa, a apuração é agregada.
A regra vale para os dois lados: cada indicação conta como uma menção. O desempenho de cada título é medido pela soma de menções dentro de cada grupo. Para o resultado publicado, entram apenas livros lançados no Brasil em 2025. Indicações de anos anteriores podem aparecer como registro, mas ficam fora da contagem do ranking e não influenciam a lista ordenada.
O Top 10 segue a ordem de menções do grupo de 30 convidados. A newsletter não muda essa ordem: serve como leitura complementar, para apontar quais títulos também aparecem entre os mais citados pelos leitores. Por isso, a estrela ao lado de um livro não indica “subida” ou “queda” de posição. Ela marca apenas a coincidência entre os dois conjuntos.
Transparência dos votos e divulgação da newsletter
No grupo de convidados, os votos são públicos: cada pessoa aparece com nome e lista. Isso permite acompanhar como o resultado se formou a partir das menções e perceber quais títulos se repetem em listas diferentes.
Na newsletter, a divulgação permanece agregada. O recorte publicado traz os títulos mais citados, sem expor a lista de cada leitor. A diferença entre as duas apresentações faz parte da apuração: de um lado, indicações individuais identificadas; de outro, uma síntese das recorrências entre leitores.
Top 10 internacional de 2025
Ordenado pelas menções do grupo de 30 convidados, o Top 10 internacional de 2025 reúne dez títulos. Na liderança está ★ “O Bom Mal”, de Samanta Schweblin, marcado por também figurar entre os mais citados na newsletter. Depois vêm “James”, de Percival Everett, e “O Polonês”, de J. M. Coetzee. A quarta posição é ocupada por ★ “Sem Despedidas”, de Han Kang.
Em seguida aparecem “Suttree”, de Cormac McCarthy, “A Contagem dos Sonhos”, de Chimamanda Ngozi Adichie, e “Kitchen”, de Banana Yoshimoto. Na sequência, entram ★ “Memória de Menina”, de Annie Ernaux, e ★ “Para John”, de Joan Didion. A lista se completa com “O Retorno do Barão de Wenckheim”, de László Krasznahorkai.
Como ler a estrela neste recorte
A newsletter não funciona como um segundo ranking numérico concorrente. Ela entra como marcador de coincidência: os livros que também aparecem entre os mais citados pelos leitores recebem uma estrela na lista final.
No recorte agregado da newsletter, os internacionais mais citados foram “O Colibri”, “Sem Despedidas”, “O Bom Mal” e “Memória de Menina”. Entre esses, três coincidem com o Top 10 e, por isso, aparecem com estrela: “O Bom Mal”, “Sem Despedidas” e “Memória de Menina”. A estrela não altera posições, não soma menções e não muda a ordem publicada.
O que esta suíte registra
Este texto reúne o resultado internacional e as regras de contagem informadas para 2025. Não há resenha dos livros nem justificativas literárias para posições. O que aparece aqui é a ordem por menções do grupo de convidados, o critério de validade do ano de publicação no Brasil e a marcação das coincidências com a newsletter.
A leitura pode seguir dois caminhos: a ordem do Top 10, definida pelo total de menções entre os convidados, e a marcação da estrela, que mostra onde houve coincidência com os mais citados da newsletter. A publicação do Top 10, no recorte anual, foi adotada para preservar legibilidade e destacar os títulos com maior recorrência entre os convidados.
Nesta suíte, ficaram de fora os títulos nacionais e qualquer informação que não esteja prevista nas regras de apuração. A lista não traz números de menções por livro nem apresenta a soma total de indicações do grupo, porque este recorte se limita à ordem publicada e ao sinal de coincidência com a newsletter. Também não há detalhamento dos votos dos 100 leitores, já que essa etapa é divulgada de forma agregada. O resultado apresentado aqui é o Top 10 internacional contabilizado para 2025, com a regra de menção aplicada aos dois conjuntos.

Em narrativas de precisão cirúrgica, a coletânea reúne histórias em que o cotidiano, cuidadosamente reconhecível, começa a ceder por dentro. Nada explode de imediato: instala-se um desalinho progressivo, como se a realidade estivesse um grau fora do eixo. A voz é econômica e atenta ao detalhe mínimo; a tensão nasce menos do acontecimento do que da percepção, do que se insinua antes de se explicar. Os protagonistas atravessam telefonemas, retornos, encontros familiares, tarefas domésticas, conversas que deveriam ser simples. Em cada situação, um afeto se desloca: o cuidado vira vigilância, a saudade ganha peso de ameaça, a intimidade se contamina por culpa e por uma hostilidade que ninguém declara. A escrita acompanha esse processo com frases firmes e sem ornamento, abrindo espaço para que o leitor sinta a aproximação do estranho como quem percebe uma febre antes do diagnóstico. Em vez de soluções ou moralizações, as histórias investem na ambiguidade: o gesto que protege também fere; o amor que sustenta também exige; a normalidade, quando insistida, revela suas fraturas. O resultado é um mapa de fragilidades contemporâneas em que o inquietante não vem de fora, mas emerge do interior das relações, do que já estava latente e finalmente encontra forma. Ao término, permanece um desconforto lúcido, como se o mundo tivesse se tornado ligeiramente irreconhecível — e, ainda assim, inevitavelmente familiar.

A narrativa se ergue de uma voz que recusa o lugar que lhe reservaram, tanto a história quanto a literatura. Em primeira pessoa, o protagonista observa a sociedade escravista com inteligência aguda e domínio estratégico da linguagem, revelando uma interioridade que precisa permanecer escondida para sobreviver. Cada movimento é calculado: o que se diz, o que se silencia, o que se encena. O humor seco e a ironia não aliviam a brutalidade; apenas a tornam mais nítida. O percurso se desenrola como travessia em território instável, onde margens e vilarejos compõem uma geografia de risco. Alianças se formam e se desfazem, a ameaça muda de rosto, e a segurança nunca é permanente. A escrita alterna observação mordaz e tensão contida, fazendo do cotidiano uma arena moral na qual a violência estrutural é constante, mesmo quando não explode. Ao assumir o controle da própria história, o narrador expõe como a linguagem pode ser abrigo e arma: a aparência de submissão funciona como máscara, e a lucidez precisa operar no subterrâneo. Há também uma força íntima que orienta a urgência: a liberdade não é abstração, mas possibilidade concreta de recompor laços e escolher um destino negado. O romance desloca o foco para aquilo que sempre esteve ali, porém raramente foi escutado: uma inteligência forjada sob coerção e uma ética de sobrevivência que não pede permissão para existir.

A narrativa se organiza em torno de um encontro marcado pela assimetria: um artista consagrado, já idoso, e uma mulher que o recebe em uma cidade estrangeira após um concerto. O que deveria ser um episódio breve se transforma em vínculo difícil de nomear, sustentado por expectativas desencontradas e por uma insistência que resiste ao limite imposto pelo outro. A escrita acompanha esse descompasso com rigor e economia, evitando qualquer sentimentalismo. Em gestos mínimos — uma carta enviada, uma visita reiterada, uma conversa interrompida por falhas de compreensão — o desejo se revela como força que se alimenta de mal-entendidos. A linguagem, atravessada por traduções imperfeitas e silêncios estratégicos, torna-se campo de atrito: o que se quer dizer não coincide com o que se consegue dizer, e a inadequação passa a ser parte do próprio afeto. A música, sobretudo Chopin, atua como horizonte simbólico, um ideal de harmonia que a vida não consegue sustentar. O romance observa, com frieza deliberada, como o amor pode se converter em projeto unilateral, quase abstrato, indiferente à resposta do outro. A recusa não chega em forma dramática; instala-se como fato reiterado, e a persistência do sentimento passa a expor seus contornos éticos. A mulher mantém uma opacidade firme, recusando o papel que lhe atribuem. Com estrutura depurada, o texto interroga o que acontece quando a lucidez não basta para dissolver uma ilusão — e quando a insistência se aproxima do autoengano.

A narrativa começa com um deslocamento aparentemente simples: uma escritora deixa a cidade e viaja para a ilha de Jeju a pedido de uma amiga. O gesto, porém, abre uma fenda temporal. A paisagem insular — frio, neve, casas silenciosas — torna-se extensão da consciência, um lugar em que passado e presente se sobrepõem com insistência. A viagem se transforma em imersão: não apenas em lembranças pessoais, mas em uma memória coletiva marcada por violência e apagamento. A escrita recusa a linearidade e aposta numa prosa rarefeita, quase meditativa, em que imagens fragmentadas, sensações físicas e reflexões éticas emergem sem hierarquia. O trauma histórico não aparece como relatório, e sim como presença difusa, infiltrada em objetos, nomes, hesitações da linguagem. O silêncio ocupa o centro do livro: não como vazio, mas como forma de escuta diante do indizível, como reconhecimento do que não se elabora com rapidez nem se resolve com explicações. As relações humanas surgem frágeis, atravessadas por distância e por um cuidado tenso. Há um desejo de amparo, mas também a consciência de que nenhuma reparação é completa. A narradora observa o próprio impulso de narrar e seus limites, como se escrever fosse, ao mesmo tempo, tentativa de aproximação e constatação da falta. Com rigor formal e delicadeza extrema, o romance investiga o que significa lembrar quando o mundo prefere esquecer — e como a memória, quando retorna, altera a textura do presente e exige responsabilidade.

A narrativa acompanha a vida errante de um homem que escolhe habitar as margens — físicas e simbólicas — de uma cidade do sul dos Estados Unidos. Instalado próximo ao rio, afastado de laços familiares e de qualquer promessa de estabilidade, ele atravessa os dias entre trabalhos ocasionais, bares, pensões, prisões improvisadas e longas horas de observação. O mundo ao redor é áspero: pobreza, doença e violência difusa compõem um cenário em que o extraordinário é apenas outra forma do cotidiano. A estrutura é episódica. Cenas que parecem autônomas vão, pouco a pouco, delineando uma ética da recusa e da permanência. A voz narrativa combina lirismo rigoroso e humor brutal; descreve o grotesco sem complacência e encontra beleza em lugares que normalmente escapam à atenção. Há um peso sensorial constante: corpos exaustos, cheiros, calor, lama, a matéria da cidade como se fosse também matéria moral. As relações surgem como alianças instáveis, feitas de cumplicidade momentânea e abandono iminente. Não há promessa de redenção nem arco confortável; impõe-se uma lucidez dura, construída na convivência com a perda. O passado retorna em fragmentos, insinuando culpas e lutos que não se organizam em confissão. Entre o riso e a náusea, o romance compõe um retrato obstinado de uma humanidade sem verniz, teimosa em continuar — e de um homem que, ao escolher a margem, paga o preço de uma liberdade sem garantias.

O romance se constrói a partir de vozes múltiplas que, sem se fundirem, iluminam zonas distintas da experiência feminina contemporânea. Cada trajetória se apresenta como campo de tensão entre desejo e contenção, escolha e expectativa social, revelando como intimidade e contexto histórico se entrelaçam de modo indissociável. A alternância de perspectivas preserva a singularidade de cada consciência, evitando hierarquias e permitindo que as contradições permaneçam abertas. As personagens atravessam relações amorosas instáveis, dilemas profissionais, maternidade, solidão e pertencimento, sempre sob a pressão de normas que moldam — e frequentemente limitam — suas possibilidades de ação. O texto não busca sínteses conciliatórias: prefere expor fraturas, impasses e ambiguidades, mostrando como decisões íntimas carregam um custo social e emocional. O tempo narrativo avança e recua, formando um mosaico em que passado e presente se respondem, como se cada lembrança produzisse novas perguntas em vez de fechar feridas. A linguagem é direta, mas nunca simplificadora. Há atenção às nuances do afeto, à política do corpo e às assimetrias de poder que atravessam tanto os vínculos privados quanto os espaços públicos. O olhar crítico aparece sem didatismo, confiando na força das situações para revelar estruturas mais amplas. Ao acompanhar essas histórias em paralelo, o romance insiste na pergunta que as atravessa: o que se conta, afinal, quando se tenta medir a distância entre o que foi sonhado e o que foi possível viver.

A narrativa se inicia após uma perda que reorganiza a vida da protagonista. Subitamente sozinha, ela passa a circular por espaços domésticos que não lhe pertencem, encontrando na cozinha — lugar de preparo, repetição e silêncio — uma forma inesperada de abrigo. Em primeira pessoa, a voz é franca e melancólica, mas evita a autopiedade: a emoção aparece no modo como o cotidiano é observado, não em declarações grandiosas. O dia a dia se torna território de recomposição gradual. Preparar alimentos, arrumar, lavar, compartilhar refeições cria um ritmo em que o luto não é superado, mas incorporado. A dor se mistura a uma fome de continuidade: a necessidade de permanecer, de manter o corpo no mundo. As relações humanas surgem como encontros provisórios, marcados por cuidado discreto e uma empatia que não exige confissões; o afeto se manifesta mais como presença do que como discurso. A escrita privilegia uma sensibilidade delicada, capaz de captar estados emocionais fugidios sem fixá-los em categorias rígidas. O tempo se expande em pequenas cenas, permitindo que a protagonista reconheça a própria vulnerabilidade sem transformá-la em drama. A solidão não aparece como falha, mas como condição a ser habitada com atenção. Ao longo do romance, a cozinha se consolida como espaço simbólico de continuidade: ali, a repetição dos gestos cotidianos oferece estabilidade diante da perda, fazendo do simples ato de viver — um dia após o outro — uma forma discreta de resistência.

A narrativa parte de um gesto retrospectivo radical: uma mulher adulta retorna a um episódio da adolescência e o examina com precisão implacável. Não há nostalgia, mas investigação. O passado é interrogado como documento, na tentativa de compreender como desejo, vergonha e submissão participaram da formação de uma identidade feminina. A escrita se afasta de qualquer reconciliação fácil, preferindo um olhar analítico que tensiona memória e consciência social. O texto alterna tempos e registros, colocando em confronto a jovem que viveu a experiência e a mulher que agora a observa. Essa distância não produz alívio; ao contrário, expõe a persistência do trauma e a dificuldade de atribuir sentido ao vivido. A narradora recusa explicações que domestiquem a violência simbólica, insistindo nas zonas de opacidade, desconforto e silêncio — onde a linguagem falha e, justamente por isso, revela seu limite. A frase é direta, econômica, rigorosa. Cada observação parece medir o peso ético de dizer, evitando tanto sentimentalismo quanto acusação simplificadora. O que emerge é uma reflexão sobre estruturas que moldam o desejo feminino, naturalizam desigualdades e transformam a experiência individual em sintoma coletivo. Ao transformar memória em objeto de análise, o livro propõe uma escrita sem absolvição: um enfrentamento que devolve complexidade ao vivido e recusa o apagamento como destino. O íntimo, aqui, não é refúgio — é campo de prova.

O livro se organiza como um conjunto de registros dirigidos ao marido, transformando a intimidade em método de pensamento. A narradora escreve para organizar o que não cabe no discurso público e para testar, em voz baixa, hipóteses sobre si mesma. As anotações acompanham sessões com um psiquiatra e registram falas, perguntas, pausas e reações com minúcia, como se a linguagem fosse instrumento clínico e, ao mesmo tempo, abrigo precário. A matéria do texto é a vida mental em trabalho: memórias de infância, medo, culpa, hábitos destrutivos, a experiência do cuidado e a dificuldade de nomear o afeto sem torná-lo refém de explicações fáceis. A relação com a filha surge como foco persistente de inquietação, atravessada por ansiedade, fragilidade e a sensação de que o amor pode ser também campo de exaustão. Em paralelo, a escrita observa o próprio ofício: como continuar narrando quando a concentração falha e o mundo perde contorno. Mais do que confissão, há autoinquérito. A narradora percebe onde dramatiza, onde omite, onde racionaliza; expõe o atrito entre lucidez e vulnerabilidade sem oferecer síntese. O destinatário silencioso funciona como contrapeso: alguém a quem se pode dizer o que não se diria a um leitor, e cuja presença imaginada altera o modo de registrar a dor. Sem buscar conclusões, o livro faz do diário uma tentativa de manter continuidade em meio à instabilidade — e de sustentar, pela escrita, uma forma de permanência.

A narrativa se inicia com a expectativa febril em torno do retorno de um aristocrata decadente a uma pequena cidade húngara marcada pelo abandono. A notícia de sua chegada reativa fantasias coletivas de salvação, prosperidade e reorganização moral. O romance acompanha esse movimento como fenômeno contagioso: cada habitante projeta no retorno anunciado seus delírios, frustrações e desejos reprimidos, como se uma figura externa pudesse ordenar o caos interno da comunidade. A estrutura é coral e vertiginosa. As vozes se acumulam em longos períodos sintáticos, criando um fluxo contínuo que dissolve fronteiras entre o individual e o coletivo. A cidade aparece como organismo em decomposição, atravessado por ressentimento, paranoia e uma fome desesperada de sentido. O olhar narrativo não concede privilégios morais: observa com ironia cruel tanto a ingenuidade quanto a violência latente que se infiltra na espera, e registra o modo como discursos públicos se transformam em caricaturas de autoridade. O retorno funciona menos como promessa concreta do que como catalisador simbólico. Ele expõe a fragilidade das instituições, a vacuidade das falas oficiais e a facilidade com que esperança pode virar histeria. O grotesco convive com o trágico, e a sátira se mistura a uma percepção aguda do colapso social. Com prosa densa e hipnótica, o romance transforma a expectativa em força corrosiva, revelando a anatomia de uma comunidade incapaz de sustentar qualquer projeto comum — apenas a própria vertigem.


