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A comédia romântica fofinha do Prime Video que deixa a semana mais leve (sem esforço) Divulgação / Amazon Prime Video

A comédia romântica fofinha do Prime Video que deixa a semana mais leve (sem esforço)

“Merv”, dirigido por Jessica Swale, trata a simplicidade como um trunfo. O enredo acompanha Merv, funcionário metódico de uma empresa de logística, e Lina, designer freelancer cuja vida parece sempre fora do lugar. O conflito não se esconde: dois estranhos se esbarram num momento em que ambos desejam algo que mal conseguem nomear e aquilo que poderia ser só um encontro casual vira uma sequência de tentativas atrapalhadas de conexão.

Swale olha para o cotidiano dos dois com um humor que nasce menos de piadas do que de reparos. Merv fala pouco, mede cada gesto; Lina fala demais, mas quase nunca entrega o que sente. A graça está no desalinho. Ele manda uma mensagem longa, educada, pensada; ela devolve um emoji difícil de ler. Ela sugere um café e ele já escuta compromisso. O amor, aqui, funciona como um sistema de ruídos.

O primeiro encontro é um pequeno laboratório de interferências. Um atraso, a reserva que some, um garçom sem paciência. Parece pouco, mas o filme trata o tempo com precisão: cada segundo de constrangimento empurra uma decisão. O obstáculo não é o acaso, é o medo. Medo de parecer carente, medo de insistir, medo de ser o primeiro a gostar. Swale se interessa menos pelo romance como ideia e mais pelas defesas que o corroem.

A cidade sem cartão-postal e o aperto da intimidade

A cidade, filmada sem charme de cartão-postal, ajuda a manter o tom prosaico. Ruas estreitas, cafés miúdos, luzes frias. O cenário não vira moldura; vira eco, porque tudo parece um pouco apertado, como se o espaço urbano conspirasse contra a intimidade. Quando Merv e Lina caminham lado a lado, o enquadramento dá a impressão de precisar de ar. Essa claustrofobia leve do dia a dia, com ônibus passando, janelas abertas demais e portas que batem, transforma o entorno num personagem silencioso.

Ritmo de espirais, quase-toques e tempo correndo

Swale sabe que comédia romântica vive de ritmo, e organiza o filme em pequenas espirais. Uma conversa sai torta, vem a tentativa de conserto, e então outra confusão. Não há vilões, nem sermão; existe o relógio do cotidiano e o medo de perder a hora certa. Quando Merv para antes de tocar o braço de Lina, o gesto interrompido pesa mais do que qualquer frase ensaiada. É um romantismo tímido, construído no quase.

Lina, interpretada com naturalidade e humor, é o coração inquieto da história. Ela tenta parecer leve, mas carrega o cansaço de quem já recomeçou demais. Merv puxa para o lado oposto: alguém que quase nunca começa, com receio de não saber sustentar. Essa diferença de tempo entre os dois move o filme. Cada aproximação esbarra no ritmo interno do outro e, desse choque, sai a graça.

Gestos mínimos, ruídos do mundo e o risco do ridículo

O humor se apoia em gestos comuns, desses que acontecem sem plateia. Uma xícara transborda, uma ligação cai, um presente chega cedo demais. Swale filma esses detalhes sem pressa, com uma montagem que parece ouvir o silêncio entre as frases. O som do ambiente, ônibus, teclados, talheres, lembra que o mundo não pausa para o amor. As coisas acontecem enquanto algo, sempre, atrapalha.

Há um momento em que Merv, sem planejar, deixa escapar uma sinceridade grande demais para o tamanho da conversa. Lina responde com uma risada curta, defensiva. É uma troca simples, quase invisível, e ela muda o tom do filme. Ali aparece o risco mais alto: a linha fina entre o riso e o vexame, entre o desejo e o medo de parecer ridículo. Dá para sentir que algo poderia virar e talvez vire, mas o filme não promete.

“Merv” se equilibra nessa mistura de doçura e desconforto. Jessica Swale não tenta reinventar o gênero; prefere devolvê-lo a uma humanidade reconhecível. O amor não surge como destino nem espetáculo, e sim como uma sucessão de microdecisões: responder, esperar, perdoar, insistir. No trecho final, a história desacelera, como quem aceita que nem todo romance precisa de uma grande prova. Às vezes basta o gesto mínimo: um olhar que demora, um sorriso que volta depois do erro.

No fim, o riso que sobra é leve, quase envergonhado, como o toque de quem ainda não sabe se deve. “Merv” é uma comédia romântica sobre o comum e é justamente aí que o charme se instala.

Filme: Merv
Diretor: Jessica Swale
Ano: 2025
Gênero: Comédia/Romance
Avaliação: 7/10 1 1
★★★★★★★★★★