Charlize Theron tem se notabilizado por defender com propriedade histórias plenas de ação que só podem convencer o espectador em enredos bem-cuidados, nos quais toda ação acontece no devido momento, no lugar exato e pelas justas razões: foi assim em “Mad Max: Estrada da Fúria” (2015), dirigido por George Miller, e “Atômica” (2017), levado à tela por David Leitch. Theron entende como ninguém que, empregado com adequação, o recurso da violência torna-se nada mais que um trampolim para que o público alcance a complexidade do que se deseja contar. Ao mesmo tempo que se livra de antigas referências e deixa-se penetrar no espírito do personagem da vez, a atriz preserva a cólera ancestral de uma criatura que tem de se impor pela força, proibida de extravasar sentimentos com qualquer semelhança com os românticos, sob pena de, se o fizer, arrastar consigo uma legião de desgraçados como ela. A protagonista de “The Old Guard 2” é um caldeirão de ódio, fervendo em fogo baixo pelos séculos dos séculos.
A cargo de Victoria Mahoney, a sequência do filme de Gina Prince-Bythewood mantém o espírito da narrativa original, ampliando o leque para possibilidades dramáticas surpreendentes. Andrômaca, a guerreira milenar que lidera um pequeno esquadrão de soldados imorredouros, é agora uma reles mortal, porém munida daquele empenho para lutar contra os malfeitores que conhece há séculos.
Analogamente ao longa que abre a franquia, o roteirista Greg Rucka, responsável pela adaptação da graphic novel homônima coescrita com Leandro Fernandez, concentra em Andrômaca as cenas mais elaboradas, e Andy faz bonito. Ela vai da Croácia à Coreia do Sul, e chega a Rimini, no litoral nordeste italiano, atrás de uma quadrilha de traficantes de armas, ajudada por Nicolò, o Nicky, vivido por Luca Marinelli; Joe, de Marwan Kenzari; e Nile, a fuzileira naval encarnada por KiKi Layne. James Copley, o antigo rival interpretado por Chiwetel Ejiofor, juntou-se ao time e responde pela logística, e o quinteto parece não ter um desafiante à altura. Até que velhos fantasmas tornam a assombrá-los.
Nile vê em sonhos uma mulher chamada Discórdia, que rouba a biblioteca de Tuah, imortal a quem Mahoney dedica um espaço maior que o justo, mas que conduz o filme para onde ele deve se firmar. Os personagens de Henry Golding e Uma Thurman assumem posições antagônicas quanto a Andy e seus comandados, mas são igualmente supérfluos, deixando inequívoco para o público que atente para Booker e Quỳnh, mais chegados à atmosfera mais intimista desejada pela diretora, que manifesta uma preferência por sugerir em vez de entregar tudo de mão beijada. Matthias Schoenaerts e, tanto mais, Veronica Ngō entram na história visivelmente animados, sustentando a onipresença de Theron — o propósito de “The Old Guard 2” —, mas cavando brechas para também mostrar seu talento.
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