O romance natalino da Netflix que chegou hoje para aquecer seu coração e te fazer acreditar no amor outra vez Mika Cotellon / Netflix

O romance natalino da Netflix que chegou hoje para aquecer seu coração e te fazer acreditar no amor outra vez

O amor é uma utopia sem a qual o mundo não seria capaz de seguir em frente, sufocado em seus escombros de orgulho sem lógica, empenho desmedido por causas obscuras, desprezo por tudo quanto não se relacione diretamente a nós mesmos e o resultado inescapável e feroz de tudo isso, a solidão, mal que atravessa os séculos e parece ter cada vez mais vontade e força de continuar sua jornada rumo ao domínio completo da vida do homem. Evidentemente, há antídotos para veneno tão arrasador, mas, como tudo na vida, há que se pagar um preço que muita gente considera absurdo, tão perdidas estão em seus tão particulares devaneios. Acreditar no amor não é exatamente fácil: talvez seja o que existe de mais misterioso no enigma sem solução que é viver. Mark Steven Johnson faz o que está a seu alcance quanto a imaginar o sentimento amoroso para um pouco mais longe que o delírio. Seu “Borbulhas de Amor” aposta boa parte das fichas em sequências pensadas com a intenção de pegar o espectador pelos olhos — e pelo estômago, por que não? —, nos diálogos que já adivinhamos quando se trata de exaltar a mais humana das emoções e na parceria afinada de seus protagonistas, bons por si sós, melhores juntos. Johnson martela em seu roteiro passagens típicas dos contos de fadas que todos conhecemos dos tempos de criança, com ligeiras adaptações, reservando para o desfecho surpresas nem tão reveladoras assim, mas estimulantes de qualquer forma. Aqui, a donzela não é tão inocente e vulnerável, trabalha e preza por sua independência, mas persevera numa busca subjetiva, sem dúvida algo que a torna muito atraente.

Sydney Price é uma das executivas mais aplicadas do Grupo Roth, uma holding internacional especializada em administrar empresas produtoras de bebidas. Embora tenha ambição e talento, Sydney ainda não conquistou o espaço que merece, porém isso está prestes a mudar quando aparece a chance de representar seus patrões na aquisição do Château Cassell, uma renomada vinícola especializada no legítimo espumante francês que fica, claro, em Champagne, a lendária província no extremo norte da França. Metodicamente, o diretor-roteirista esmiúça a personalidade de Sydney, uma workaholic orgulhosa de suas escolhas, mas que também precisa deixar-se seduzir pelas belezas da vida além-escritorio e relaxar. Esse é o teor da conversa que tem com Skyler, a irmã vivida por por Maeve Courtier-Lilley, antes de embarcar, sem saber que o trabalho acabará mesmo em segundo plano. Ela decide que aproveitará sua única noite de folga em Paris antes de viajar para Champagne, pede a Marcel, o concierge, uma indicação de livraria e se dirige à Les Étoiles, a alguns metros do hotel. Ela procura por um título de autoajuda para Skyler, vê um homem recomendando leituras para uma cliente e pede-lhe que a auxilie. Os dois se entreolham, sorriem um para o outro e então a magia acontece.

Como se vai assistir, o rapaz não era vendedor, mas o herdeiro enjeitado da Château Cassell. Henri se interessa muito mais em cultivar os prazeres simples da vida, como frequentar estabelecimentos que unam as suas duas paixões, volumes com o melhor da literatura universal e, por evidente, vinhos, e pretende abrir um negócio no ramo assim que encontrar um bom ponto. Johnson concentra aí o eixo da narrativa e faz o que resta da história no enfrentamento tácito de Henri e o pai, Hugo, o dono da fábrica de champanhe. Se na virada do primeiro para o segundo ato Minka Kelly e Tom Wozniczka dão ao público as possibilidades românticas e anti-românticas obrigatórias, Thibault de Montalembert junta-se aos dois como o fiel da balança, conduzindo a trama a um andamento mais reflexivo, com direito a respiros cômicos do elenco de apoio. A certa altura, a dissertação de Sydney e Otto Moller sobre “Duro de Matar” (1988), de John McTiernan — ou “Duro de Morrer”, como os alemães o chamam —, com comentários bastante inventivos acerca de Hans Gruber, o vilão eternizado por Alan Rickman (1946-2016), arrancam uma risada espasmódica. Flula Borg e Sean Amsing, o farrista profissional levado por Roberto Salazar que quase bota a perder os planos da mocinha, roubam a cena sem cerimônia. Como pode-se verificar, boas atuações são um perrengue chique nesse filminho gracioso e cativante. Ou champagne problems, como diz o título original.

Filme: Borbulhas de Amor
Diretor: Mark Steven Johnson
Ano: 2025
Gênero: Comédia/Romance
Avaliação: 8/10 1 1
★★★★★★★★★★
Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.