Um dos filmes de ação mais divertidos dos últimos anos está na Netflix e é impossível assistir parado Divulgação / Sony Pictures

Um dos filmes de ação mais divertidos dos últimos anos está na Netflix e é impossível assistir parado

Em “Bad Boys para Sempre”, o policial Mike Lowrey continua a circular por Miami com o mesmo gosto por carros velozes, roupas caras e operações de alto risco. O parceiro Marcus Burnett, mais velho e cansado, pensa com seriedade em aposentadoria, netos e vida doméstica. A rotina dos dois muda quando uma série de ataques em Miami atinge figuras ligadas a investigações antigas e expõe um inimigo com ligações diretas com o passado de Mike, o que torna o caso pessoal e reacende uma antiga sede de acerto de contas.

O filme volta a reunir Will Smith e Martin Lawrence como a dupla de detetives e coloca a direção nas mãos de Adil El Arbi e Bilall Fallah, que assumem a franquia depois de duas produções comandadas por Michael Bay. A história apresenta Isabel Aretas, ligada a um cartel mexicano, e seu filho Armando como responsáveis por uma campanha de assassinatos que mira promotores, policiais e, em determinado momento, o próprio Mike. A investigação passa a envolver não só a polícia de Miami, como também uma unidade mais jovem e especializada, e obriga o protagonista a encarar decisões tomadas décadas antes, quando atuava de forma ainda mais agressiva e autoconfiante.

A relação entre Mike e Marcus segue como eixo do filme. Smith interpreta um policial que tenta preservar a imagem de invencível, mesmo depois de perceber que não acompanha mais o ritmo das perseguições e lutas com a mesma facilidade. Lawrence reforça o lado cômico de Marcus, que prefere se afastar da violência e valoriza a casa, a família e algum descanso, mas também deixa à mostra o medo real de perder o parceiro. Essa divergência de desejo cria atrito entre os dois e sustenta boa parte das discussões, que oscilam entre piadas e confissões sobre idade, culpa e finitude.

A camada de thriller aparece na forma como o roteiro monta o quebra-cabeça em torno de Isabel e Armando. A dupla responsável pelos crimes usa ataques rápidos, executados em locais públicos, o que pressiona a polícia e aumenta o peso político da investigação. Cada novo ataque leva a informações sobre o passado de Mike, que se vê obrigado a revisitar casos antigos e ligações com operações conduzidas longe dos limites oficiais da lei. A busca por pistas envolve interrogatórios, incursões em áreas controladas por facções e o uso de tecnologia de vigilância, o que dá ao filme ritmo constante de perseguição, recuo tático e retomada da caçada.

A ação segue um padrão de cenas longas, com tiroteios, perseguições de carro e confrontos corpo a corpo. Adil El Arbi e Bilall Fallah demonstram empenho em manter a geografia clara, apesar dos cortes rápidos. A câmera se movimenta com frequência, mas deixa visível onde cada personagem está em relação aos demais. Miami é filmada como cidade de festas, luzes coloridas e trânsito intenso, o que reforça o contraste entre a fachada de diversão e a violência que se espalha por suas ruas. Há explosões, quedas e colisões em quantidade suficiente para atender ao público da franquia, com um pouco mais de cuidado visual do que o caos assumido dos dois primeiros filmes.

A comédia aparece sobretudo nos diálogos e na postura de Marcus diante da volta à ativa. Ao se ver arrastado para uma investigação que prometera evitar, ele reclama, exagera reações e comenta situações com humor físico e verbal. Will Smith reage com ironia e impaciência, mantendo o tom de galã de ação que precisa provar que ainda aguenta o tranco. A dinâmica entre os dois sustenta momentos em que a narrativa reduz a velocidade para explorar o contraste entre o veterano que se recusa a parar e o amigo disposto a abandonar o campo de batalha. Quando o filme permite que cenas de hospital, velório ou celebrações familiares convivam com o humor, o resultado é um tipo de comédia atravessada por medo e exaustão.

A introdução do grupo tático AMMO coloca em cena uma nova geração de policiais, equipada com drones, armas menos letais e computadores de análise rápida de dados. Os jovens agentes, interpretados por Vanessa Hudgens, Alexander Ludwig e Charles Melton, representam um estilo de trabalho mais técnico, disciplinado e dependente de telas. A convivência com Mike, que prefere resolver conflitos a partir de instinto e confrontos diretos, produz choque de métodos e rende comentários sobre envelhecimento profissional, resistência a protocolos e disputa por espaço em operações de alto risco. O choque geracional também ajuda a introduzir novos rostos na franquia sem afastar a atenção da dupla principal.

A direção procura equilibrar o tom de diversão com um interesse mais evidente pelo desgaste emocional dos personagens. O roteiro reserva espaço para que Mike manifeste culpa por decisões tomadas em operações passadas e para que Marcus expresse cansaço diante da repetição de ciclos de vingança. Nem sempre esse interesse por drama encontra tempo suficiente entre as cenas de tiro e perseguição, e alguns diálogos soam explicativos, com personagens verbalizando traumas em termos diretos demais. Ainda assim, o conflito central entre lealdade, envelhecimento e desejo de revanche ganha densidade suficiente para afastar o filme da simples repetição de fórmulas.

Em termos de vilania, Isabel e Armando aparecem como ameaças convincentes em cenas de ação, com foco no planejamento frio dos ataques e na capacidade de atingir alvos protegidos. As motivações da dupla são relacionadas a danos causados por operações antigas, o que aproxima o perigo atual de falhas passadas da polícia. Quando o roteiro tenta aproximar mais a história de Armando da vida íntima de Mike, aposta em um melodrama que nem sempre é preparado com pistas discretas. Mesmo assim, a conexão entre o passado do protagonista e a nova geração de criminosos reforça a ideia de que decisões tomadas em segredo voltam à superfície com força renovada.

“Bad Boys para Sempre” acaba por funcionar como reencontro entre público e personagens em situação de desgaste físico e moral. A produção preserva a marca registrada da franquia em termos de humor e exagero visual, mas aceita que seus heróis já não correm pela cidade com a mesma leveza de décadas atrás. Entre tiros, piadas e revisões do passado, o filme acompanha dois policiais que insistem em continuar em campo mesmo quando o corpo e o mundo à volta indicam outra direção.

Filme: Bad Boys para Sempre
Diretor: Adil El Arbi e Bilall Fallah
Ano: 2020
Gênero: Ação/Comédia/Crime/Thriller
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★