10 filmes filosóficos na Netflix que desafiam o modo como você entende a vida

10 filmes filosóficos na Netflix que desafiam o modo como você entende a vida

Ninguém vive sem dinheiro, a cruenta força que move o mundo. Atropelando consciências, essa ferramenta essencial para a civilização promete liberdade, mas encarcera; garante autonomia, e logo mostra sua sanha por dominar; ludibria os mais espertos com seu charme monstruoso. Dinheiro não corrompe ninguém, dizem alguns, apenas desvela a oculta natureza de certos indivíduos, que, diabolicamente encantados, tratam de se esquecer de valores que estorvam a subida. Honestidade torna-se medo, e honra, um luxo arcaico a que nem todos podem se dar. O homem vai perdendo-se numa corrida tola, sem perceber que larga pelo caminho o tesouro que ninguém poder-lhe-ia afanar.

Considerado um dos pais da filosofia, o grego Aristóteles (384-322 a.C.) dedicou a vida a fim de provar que de tudo, rigorosamente tudo na vida, tira-se uma lição a que nunca será possível renunciar no que toca a viver em harmonia e paz. Aristóteles concluiu que sobre toda ciência, acima de todo o conhecimento humano, paira um conjunto de domínios a respeito de todas as áreas do saber: a metafísica, a substância incorpórea que transcende a carne. A alma reta é, indubitavelmente, o maior exemplo de intrepidez e bravura a que alguém pode aspirar, em especial neste nosso insano século 21. Sociedades contemporâneas não têm pejo nenhum de descartar os virtuosos pelos oportunistas, estabelecendo um modelo perigoso, que confunde progresso com uma total ausência de limites.

Para Arthur Schopenhauer (1788-1860), a vida era somente uma vontade de vida, isto é, existimos sob a forma de mera sondagem de nossos próprios desejos, em especial dos mais vagos, quiçá tétricos. O pessimismo do alemão funda-se na ideia da errônea busca do homem por estabilidade e certezas mirando o perecível.

Em “O Mundo Como Vontade e Representação” (1818), seu trabalho mais célebre, Schopenhauer defende o conceito de vida sob a forma de uma vontade de vida. Interdita-se ao gênero humano a soberania e a prudência diante de seus quereres, uma vez que deseja, espalha destruição por todo lado. Há, portanto, que se negar toda vontade, mesmo (ou principalmente) as que, ao olhar ligeiro, induziriam a supostas boas ações.

Schopenhauer esclarece — mas não justifica — as iniquidades sociais, em tantas circunstâncias sustentadas por sistemas econômicos que exploram a miséria e glorificam os apanágios. O desalento não é uma chaga que martiriza alguns, mas uma peste global, reflexo de um mundo que cedeu lugar ao fácil em detrimento do sólido. A metafísica de Aristóteles e o pessimismo de Schopenhauer, contribuições vitais da filosofia para a humanidade, não raro ilustram roteiros de filmes os mais diversos, de maneira tão nuançada que nem chegamos a dar por isso. Dez produções na Netflix figuram nessa lista como momentos em que a beleza da arte cinematográfica encontra a ciência das ciências e suas atormentações libertadoras. E não pode haver nada mais estimulante que a simetria perfeita, a da forma com o conteúdo. Uns poucos morrerão ricos; quase ninguém morrerá sábio.

Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.