O tempo de um filme não é só o que dura na tela. Às vezes ele continua agindo depois, de forma quase imperceptível. Uma frase que volta, uma cena que incomoda, uma sensação estranha de que algo ali estava tentando dizer mais do que parecia. Nem sempre é fácil saber o que provoca esse efeito — se é o roteiro, a direção contida, o ator no momento certo, ou talvez o silêncio entre duas falas. Mas quando acontece, percebe-se. E a Netflix, entre altos e baixos previsíveis, às vezes entrega exatamente isso: obras que, mesmo discretas, permanecem. É o caso de quatro filmes que entraram recentemente no catálogo e não deveriam passar despercebidos. Não por serem grandes eventos cinematográficos — nenhum deles é. Mas por se esquivarem da pressa, dos clichês fáceis e da vontade de agradar a qualquer custo. São filmes com tempo próprio, que não parecem implorar atenção, mas merecem. Não necessariamente otimistas, nem propriamente duros. Apenas honestos em seu modo de ver o mundo. Há, por exemplo, uma história que trata da persistência em meio ao esvaziamento institucional, outra que retorna à figura do mestre como alguém que planta dúvidas, e não certezas. Uma terceira que fala de família sem sentimentalismo e uma última em que o heroísmo se confunde com obstinação silenciosa. Nenhuma dessas narrativas tenta resolver o que é irresolvível — e talvez por isso digam mais do que aquelas que vêm embaladas com conclusões. Num tempo em que o consumo se impõe até sobre o afeto, ver um filme que exige presença sem prometer recompensa instantânea pode parecer exaustivo. Mas também pode ser exatamente o que faltava. Porque o cinema, quando encontra a frequência certa, não precisa gritar. Basta sugerir. E esses quatro, de formas bem distintas, fazem isso: sugerem. Não são novidades que explodem no algoritmo, nem títulos que viralizam por acidente. São obras com miolo. Com voz. Com uma espécie de modéstia firme que, em tempos tão saturados de pose, parece quase revolucionária. Talvez não sejam filmes para todo mundo. Mas, se forem para você, vão ficar. E às vezes, só isso já vale.

Na sequência do sucesso de 2009, o detetive mais célebre da ficção retorna enfrentando seu oponente mais letal: o professor James Moriarty, interpretado com precisão por Jared Harris. O cenário europeu do final do século 19 ganha tons de conspiração internacional quando uma série de atentados aparentemente desconexos revelam um plano de guerra orquestrado nos bastidores. Robert Downey Jr. entrega um Holmes ainda mais excêntrico e cerebral, enquanto Jude Law, como o sempre leal Dr. John Watson, oferece equilíbrio e gravidade ao caos. Com cenas de ação estilizadas e diálogos rápidos, o filme explora o embate entre razão e brutalidade, estratégia e dominação. Rachel McAdams retorna brevemente como Irene Adler, e Noomi Rapace se junta ao elenco como Simza Heron, uma cigana envolvida na trama. Guy Ritchie mantém seu estilo visual arrojado, mas é na tensão psicológica entre Holmes e Moriarty que a história encontra seu ponto mais alto — uma dança mortal de intelectos.

Viktor Navorski, cidadão de Krakozhia, chega ao aeroporto JFK justamente quando seu país sofre um golpe de estado. Sem pátria reconhecida e sem visto válido, ele se vê preso no terminal internacional, impedido de entrar oficialmente nos Estados Unidos. Tom Hanks entrega uma performance delicada, comedido no humor e firme na melancolia, ao dar vida a esse homem que transforma um não-lugar em lar. Catherine Zeta-Jones interpreta Amelia Warren, comissária de bordo com suas próprias fugas internas. Inspirado em uma história real, o filme equilibra crítica à burocracia com momentos de ternura. Spielberg dirige com o olhar humanista de quem compreende o absurdo institucional, mas acredita nas conexões humanas que surgem mesmo em ambientes áridos. A narrativa transforma pequenos gestos em atos de resistência, e o terminal se torna palco de compaixão, paciência e dignidade. Ao final, não é o tempo que muda Viktor, mas sua fidelidade silenciosa à promessa que o trouxe ali.

Em plena Guerra Fria, numa pequena cidade mineradora da Virgínia Ocidental, um jovem se encanta com a corrida espacial após ver o satélite soviético Sputnik cruzar o céu noturno. Inspirado, Homer Hickam desafia o destino que o pai lhe impõe — seguir na mineração — e começa a construir foguetes caseiros com a ajuda de três colegas e o incentivo da professora Miss Riley (Laura Dern). Jake Gyllenhaal interpreta Homer com autenticidade juvenil, enquanto Chris Cooper, como o rígido pai John Hickam, representa o embate entre tradição e aspiração. Baseado na autobiografia de Homer Hickam Jr., engenheiro da NASA, o filme é um tributo à educação pública, à ciência e à persistência contra todas as probabilidades. Johnston dirige com simplicidade eficaz, e a narrativa cresce ao mostrar como o conhecimento pode ser libertador. Mais que uma história de foguetes, é uma ode ao direito de sonhar alto, mesmo com os pés enterrados no carvão.

Num colégio interno conservador da Nova Inglaterra, em 1959, a chegada de um novo professor de literatura rompe o silêncio protocolar das salas de aula. Robin Williams interpreta John Keating, educador que inspira seus alunos a pensar por si mesmos, a desafiar expectativas e a “carpe diem” — aproveitar o dia. Por meio da poesia de Whitman, Frost e outros, o filme investiga o poder das palavras quando aliadas à juventude. Os estudantes Neil Perry (Robert Sean Leonard) e Todd Anderson (Ethan Hawke) se destacam no grupo de adolescentes marcados por pressão familiar, medo e desejo de liberdade. Com sensibilidade narrativa, a obra trata de temas como conformismo, vocação e o custo emocional da rebeldia. O roteiro de Tom Schulman, vencedor do Oscar, reforça o papel transformador da educação, sem recorrer a idealismos vazios. Weir constrói uma história profunda sobre o impacto de um mestre que não ensina fórmulas, mas a urgência de sentir.