A Netflix lança dezenas de títulos por mês, mas raramente acerta em cheio. Entre acenos ao algoritmo e tentativas genéricas de viralização, pouca coisa segura por conta própria. Desta vez, não. Cinco estreias recentes, com perfis completamente distintos, chamam atenção não pela grandiosidade, mas pela solidez. “Gladiador II” expande um clássico com controle narrativo e escolhas seguras. Ridley Scott não tenta reinventar o épico, apenas o atualiza com outro corpo, outro herdeiro, outra arena. Paul Mescal assume o centro com firmeza. Denzel Washington e Pedro Pascal ajudam a dar peso. O filme não grita, mas sustenta. Já “Happy Gilmore 2”, de forma surpreendente, não apela para a nostalgia fácil. Adam Sandler volta, sim, mas em um registro mais contido, mais envelhecido, com uma comédia de ritmo mais seco. Funciona porque respeita o tempo que passou. “Meu Ano em Oxford” vai por outro caminho. Parece romance leve, mas fala de finitude, decisão e afeto real com mais maturidade do que promete à primeira vista. Sofia Carson e Corey Mylchreest se encontram num tom difícil: íntimo sem ser melodramático. No campo do terror, “Five Nights at Freddy’s — O Pesadelo Sem Fim” adapta uma franquia de jogos com mais competência do que a média do gênero. Josh Hutcherson segura a narrativa com sobriedade, e o filme não abusa de sustos gratuitos. Há atmosfera, e há um subtexto de perda que segura o roteiro no chão. Por fim, “O Terminal”, ainda que não seja novidade, voltou ao catálogo e vale ser revisto. Spielberg, em tom menor, conduz uma história de resistência silenciosa com leveza e dignidade. Tom Hanks segura tudo com um tipo de carisma que parece escasso hoje. Juntos, esses cinco filmes oferecem experiências distintas, mas compartilham um ponto importante. São projetos com direção firme, propostas claras e execução coerente. Não tentam ser maiores do que são. E talvez seja justamente isso que faz com que cada um deles, ao seu modo, funcione tão bem.

Anna chega com um plano claro: um ano fora, um diploma inglês, um retorno certeiro à carreira financeira. A poesia, para ela, é ponte — não destino. Mas os corredores frios, os tetos altos e as bibliotecas silenciosas de Oxford a desmontam aos poucos. Jamie, colega de curso e figura enigmática, a desafia com uma leveza que ela não sabe decifrar. Ele conhece o fim antes mesmo que o meio comece: carrega uma doença que lhe apressa os dias e refina cada gesto. O romance que se forma entre os dois não busca grandiosidade, mas precisão. Cada toque, cada olhar, cada conversa parece ritmado por um relógio invisível. Anna é forçada a rever não apenas suas escolhas, mas a linguagem com que nomeia o mundo. Quando o tempo termina, o amor não desaparece — ele se transforma em direção, em matéria, em herança. O ano em Oxford não foi uma pausa. Foi o início.

A aposentadoria trouxe paz, mas também distância. Quando a filha enfrenta dificuldades para manter viva a própria paixão, Happy vê no retorno ao circuito uma chance de retribuir tudo o que um dia recebeu. O campo agora é outro: redes sociais, patrocínios, jogadores que nasceram depois do seu auge. O estilo permanece o mesmo — desleixado, impulsivo, sincero. Mas o tempo pesa. E a comédia ganha contornos de melancolia. Antigos rivais voltam à cena, não como vilões, mas como ecos de escolhas não feitas. Entre um drive torto e uma lembrança enterrada, o reencontro com o passado se revela inevitável. O humor surge não da piada, mas do atrito entre quem ele foi e quem tenta ser. O jogo, no fundo, é o mesmo: mirar com força, sem esquecer onde está o buraco. E talvez, pela primeira vez, ele entenda que não se trata mais de vencer — e sim de permanecer.

Lucius vive distante de Roma, exilado em alma e nome, carregando uma identidade que desconhece. Filho bastardo de um império em ruínas, ele retorna à arena não por glória, mas por sobrevivência. Seu corpo é lançado ao Coliseu como mercadoria, mas sua mente carrega a memória de Maximus, homem que um dia o salvou. As lutas que enfrenta não são apenas contra os gladiadores — são contra a mentira que sustentou sua história. Os imperadores Caracala e Geta governam com brutalidade, e Lucius torna-se símbolo involuntário de resistência. Guiado por Macrinus, estrategista de intenções dúbias, ele precisa decidir se se tornará mais um instrumento de poder ou uma rachadura no mármore da tirania. A violência não é espetáculo, é método. A dúvida não é fraqueza, é motor. Os deuses de Roma estão em silêncio, mas a pólvora está no ar. O destino que começa no sangue pode terminar em fogo.

Mike aceita o trabalho por desespero, não por escolha. Vigiar um restaurante abandonado durante a madrugada parece simples. Mas as câmeras não mentem: os bonecos se movem. O que parece ser um defeito técnico logo revela uma coreografia meticulosa do terror. Animatrônicos ganham vida, não como brinquedos, mas como criaturas com passado. Cada noite torna-se mais longa que a anterior, e cada batida de porta se transforma em sentença. O tempo ali é medido em resistência, e a dúvida entre o real e o alucinado não demora a surgir. O que conecta aquelas máquinas a crianças desaparecidas? Por que ele sonha com gritos que nunca ouviu? O restaurante não é apenas um lugar — é um eco de traumas não resolvidos. No escuro, a culpa é mais barulhenta que o silêncio. Mike não quer entender tudo. Ele só quer chegar à sexta noite com vida — se possível, com alma.

Viktor não entende exatamente o que aconteceu. Sabe apenas que seu passaporte já não vale. O país que o emitiu deixou de existir. Enquanto autoridades se decidem, ele permanece onde não se pode viver: o saguão de um aeroporto internacional. Com uma mala pequena e dignidade intacta, aprende a dormir entre cadeiras, se alimentar de trocos e sobreviver à rotina do impasse. Os funcionários, primeiro indiferentes, aos poucos se tornam aliados. Há humor, mas não leveza; há ternura, mas não piedade. Uma mulher cruza seu caminho — e por alguns instantes, o tempo quase volta a existir. Mas Viktor não veio buscar amor, veio cumprir uma promessa. Uma dívida antiga, feita em outra língua. Enquanto aviões decolam e aterrissam, ele permanece. Não por medo. Por integridade. O terminal é prisão e abrigo. É o lugar onde ninguém deveria ficar, mas onde alguém precisou permanecer para lembrar o que é ter palavra.