Autor: Carlos Willian Leite

A nova obsessão dos leitores não é por histórias — é por validação

A nova obsessão dos leitores não é por histórias — é por validação

A literatura é um cadáver bem maquiado. Não por ter morrido, mas por ter sido preparada para a missa dos vivos. Deitou-se a linguagem num divã e pediram que ela não fosse agressiva. As histórias agora se dobram como toalhas de hotel: asseadas, simétricas, passíveis de aplauso e pós nas redes. E, claro, sem manchas. Sobretudo, sem manchas. O leitor sensível é o novo censor. Elegante, empático, atento ao sofrimento do mundo, mas com o dedo sempre no gatilho da denúncia. Ele não quer ler para sangrar; quer ler para se sentir bom.

Meridiano de Sangue: o épico brutal que redefiniu a literatura dos últimos 50 anos

Meridiano de Sangue: o épico brutal que redefiniu a literatura dos últimos 50 anos

De algum jeito, talvez porque os olhos insistem em parar naquelas frases que sangram, é impossível não ter a sensação de que o livro está nos lendo enquanto fingimos lê-lo. Há palavras como lâminas, mais precisas do que confortáveis, narrativas feitas de silêncio e pó. “Meridiano de Sangue” não explica. Recusa explicar. Como um sonho febril, escapa quando se tenta descrever; não há chão, nem mapa, nem certeza. Há somente algo que sussurra continuamente por trás das páginas: não estamos seguros; nunca estivemos. E o que restar depois disso talvez nem importe tanto.

Homens são autores. Mulheres precisam provar que são

Homens são autores. Mulheres precisam provar que são

É sempre assim. Quando o nome de um homem aparece na lombada, a estante se enrijece. Há um eco silencioso — feito de resenhas passadas, mesas redondas, cátedras enferrujadas — que sussurra antes mesmo da primeira linha. O livro ainda nem foi lido e já é importante. Já é obra. O autor já é Autor. Um homem que escreve não escreve: atesta. Não precisa pedir licença para entrar na tradição; ela já está posta à sua espera, cadeira cativa, copa servida, currículo pronto. Escrevem como se soubessem que o mundo os lê com crédito antecipado. E talvez saibam.

4 romances insólitos, brilhantes e hilários de Juan Pablo Villalobos que valem cada milésimo de segundo do seu tempo

4 romances insólitos, brilhantes e hilários de Juan Pablo Villalobos que valem cada milésimo de segundo do seu tempo

Entre a sátira e o absurdo, há uma literatura que não pede licença para entrar. Ela invade, desestabiliza e, no fim, nos faz rir do que talvez devêssemos temer. Juan Pablo Villalobos escreve assim, como quem aponta o dedo para o ridículo, mas com elegância. Como quem entende que o riso, às vezes, é uma forma de resistência. Seus romances não entregam conforto. Entregam espanto. Com leveza de linguagem e acidez de olhar, ele revela o que há de mais sério no que parece apenas engraçado.