Baseado em best-seller premiado de Stieg Larsson, filme na Netflix vai te arrepiar Divulgação / Columbia TriStar

Baseado em best-seller premiado de Stieg Larsson, filme na Netflix vai te arrepiar

Lambanças do jornalismo e crimes de megaempresários estreitam-se num amplexo insano em “Millennium: Os Homens que Não Amavam as Mulheres”, decerto uma das histórias mais assertivamente ousadas do cinema recente, que, talvez, nem estivesse assim tão pronto para recebê-la. Se fosse necessário definir com uma palavra o filme de David Fincher, conhecido por imprimir a seus trabalhos o tom de grande novidade mesmo em versões de livros acolhidos de imediato pela crítica e venerados pelo público, “coerência” seria o vocábulo redondo. Equilibrando o nonsense e a realidade gradativamente mais difícil dos tipos melancólicos que compõem a narrativa de Stieg Larsson (1954-2004), o diretor afina o roteiro de Steven Zaillian a imagens quase sempre perturbadoras, mas que também sabem conservar a brandura que reflete a própria natureza da anti-heroína que encabeça a trama.

Lisbeth Salander, a gótica de 26 anos que adorna seu corpo pequeno com piercings e tatuagens — essa minudência de sua personalidade dá azo a uma das melhores sequência do filme, que desdobra-se em outras cenas não menos bárbaras —, parece, a despeito de como se mostra, uma moça sem nada de mais, e é justamente por aí que seu mistério começa. “A garota com a tatuagem de dragão” dá conta de si mesma desde os dez anos, sua para ganhar a vida, malgrado faça o que gosta, e passaria incógnita pelo resto da eternidade não fossem dois episódios muito relevantes, que se juntam logo no primeiro ato. Os figurinos de Trish Summerville, o cabelo e a maquiagem idealizados por Danilo tomam boa parte do show, merecidamente, ajudando Rooney Mara a encontrar a delicadeza de Salander, nada óbvia, mas que clama por ser descoberta. Uma das hackers mais talentosas da Suécia, ela tem a cara de uma boneca exótica, que todos gostam de apreciar, mas com a qual ninguém se atreve a presentear uma filha. Mara elabora à perfeição, esmeradamente, essa aura de menina de Salander, quem sabe ansiando ter a chance de reviver a infância, quando tentaria reinventar o que o destino fez dela, a contragosto. Essa antimocinha byroniana não volta no tempo, mas a sorte faz brilhar sua estrela no momento em que conhece aquele que poderia ser seu príncipe encantado. Sim, no fundo ela é uma romântica.

No momento em que conhece Mikael Blomkvist, o jornalista implicado no violento turbilhão de processos por calúnia que obrigam-no a pagar seiscentas mil coroas de indenização, dois mundos se encontram, o sol e a lua fundem-se num eclipse apocalíptico e Salander vislumbra uma nova oportunidade de aparar as diferenças com uma face de sua vida que a persegue. Daniel Craig encarna o justiceiro algo fanfarrão que na ânsia de reparar iniquidades de grã-finos pervertidos termina por ficar refém de si mesmo e de sua chefe ninfomaníaca, com quem vive um caso duradouro. A fada punk o salva, esperando ser também ela resgatada, mas sua jornada é vagar sozinha, até que lave de todo sua honra. Com o sangue de seus algozes, claro.


Filme: Millennium: Os Homens que Não Amavam as Mulheres
Direção: David Fincher
Ano: 2011
Gêneros: Thriller/Mistério
Nota: 8/10