Último filme da franquia de ação mais famosa do cinema está na Netflix e vai deixar seus olhos pegando fogo Divulgação / Sony Pictures

Último filme da franquia de ação mais famosa do cinema está na Netflix e vai deixar seus olhos pegando fogo

É um enigma que se revela para uns poucos afortunados o modelo que faz com que sucedam-se os filmes sobre um mesmo assunto — malgrado com um sem fim de variações —, os mesmos personagens, fidelidade à história original e o fator que acaba por subjugar todos os outros, o interesse do público, igual ou ascendente. Michael Bay esgrimiu esses quatro tópicos com galhardia e entregou a Adil El Arbi e Bilall Fallah uma história redonda. El Arbi e Fallah, marroquino-belgas de trinta e poucos anos, certamente têm uma ideia sólida a respeito da polícia, todavia combatem em frentes diversas, ao menos neste “Bad Boys para Sempre”, que despontou dois meses antes que a pandemia de covid-19 tomasse corações e mentes e lançasse a humanidade num precipício ainda mais fundo de paranoia e incerteza. Existe muita política e muita sociologia — nas entrelinhas do filme, o terceiro do que deveria ser uma trilogia a se analisar o caráter decisivo do título; entretanto, até as pedras da rua já sabem que os acertos entre os diretores, as produtoras e, naturalmente, a dupla de protagonistas são favas contadas e em breve “Bad Boys 4” (ou com outro nome que o valha) ganhará a praça. A pergunta de um milhão de dólares é: para quê?

Mesmo o arco que se anuncia com injustificado estrépito e delimita o início do terceiro ato — a única pretensa razão para a sobrevida do enredo em outro filme — resolve-se sem maiores acrobacias narrativas e, admitindo ou não, é precisamente isso o que quer o público. A organicidade do texto de Chris Bremmer, Joe Carnahan e Peter Craig, três dos melhores roteiristas de Hollywood hoje, é sem dúvida a grande responsável por fazer de “Bad Boys para Sempre” uma das produções mais estimulantes do gênero de todos os tempos, aliada, naturalmente, à fartura de tecnologia de que El Arbi e Fallah dispõem ao longo de 99% dos 124 minutos de projeção. O plano-sequência de cima que esfrega Miami Beach nos nossos olhos na introdução, apimentado pela trilha acelerada tratam de colocar o espectador no clima. Robrecht Heyvaert e Lorne Balfe trabalham em harmonia até o fim dando cor e som às inúmeras subtramas protagonizadas por Will Smith e Martin Lawrence na pele dos manjadíssimos Mike Lowry e Marcus Burnett, detetives-sênior do Departamento de Polícia de Miami. Tudo segue o curso esperado na vida dos dois: Mike, o personagem de Smith, continua um inveterado festeiro, um solteirão convicto e um casanova implacável, ao passo que Marcus, a consciência crítica desse estranho casal, acaba de se tornar avô. O talento de Lawrence, que não precisa de muito para encampar as piadas que encerram arroubos de riso involuntário inclusive em lances de tensão feroz, mantém a história ao abrigo de eventuais bocejos, malgrado seja ele a parte tiozão. É esse exatamente o ponto em “Bad Boys para Sempre”: embora possam se socorrer do consolo da experiência, os dois cinquentões, com estilos de vida díspares entre si e um tanto ultrapassados — para não dizer atropelados — por programas e dispositivos mais e mais modernos e que, portanto, viram sucata rápido, ainda seriam capazes de combater o crime numa metrópole vítima de megacorporações que empregam mão de obra análoga à escrava, traficantes internacionais que cruzam suas fronteiras cada vez mais certos da prosperidade de seus negócios em solo americano e o caos que advém disso tudo?

Os diretores elaboram esses núcleos com serenidade, por paradoxal que soe. Cada personagem tem seu momento e ainda que seja muito assunto para pouco mais de duas horas, as incontáveis peças desse imenso mosaico terminam se encaixando. Depois de um passeio rápido pela breve aposentadoria de Marcus, detendo-se com mais tardança na adaptação de Mike a uma tal AMMO, Aliança de Miami: Manobras e Operações, como subordinado de Rita, a investigadora vivida por Paola Nuñez. El Arbi e Fallah colocam-nos juntos outra vez, atuando com o excelente núcleo jovem, à cata de Isabel Aretas, a bandidona de Kate del Castillo que encabeça boas cenas de ação e refresca o filme com o antirromance entre sua personagem, convenientemente apelidada de Bruxa, e Mike.

“Bad Boys para Sempre” fecha do melhor jeito, o que me leva a insistir: para que mais? Mas eu, felizmente, apenas escrevo sobre filmes, não os faço e muito menos os vendo.


Filme: Bad Boys para Sempre
Direção: Adil El Arbi e Bilall Fallah
Ano: 2020
Gêneros: Thriller/Ação/Comédia
Nota: 9/10