Uma historinha de carnaval Foto / Luis War

Uma historinha de carnaval

Com os preços dos pacotes turísticos nas alturas, o jovem casal resolveu passar o carnaval em casa, no Rio.

— Você quer sair em algum bloco?

— Não, benzinho, eu prefiro ficar aqui em casa com você.

— Eu também, amor! — o rapaz concordou e os dois se beijaram ternamente.

O casal passou o sábado de carnaval em casa, vendo TV. No domingo de manhã, o rapaz acordou cedo e resolveu fazer uma surpresa para a mulherzinha. Saiu de casa para comprar um café da manhã especial para os dois. Deixou um bilhete, dizendo que voltava logo. O que ele não sabia era que, exatamente naquele instante, um bloco passava bem em frente do seu prédio. O rapaz resolveu se arriscar assim mesmo. Saiu andando pelo cantinho, se desviando dos foliões. De vez em quando algum folião mais animado se aproximava e tentava levá-lo para dentro do bloco, mas ele explicava a sua condição de não-folião.

Quando já estava chegando na padaria, o rapaz sentiu duas mãos na cintura. Tentou se desvencilhar, mas o dono das mãos o empurrava para frente. Quando olhou para trás, se deu conta de que ele era a locomotiva de um trenzinho de rapazes e moças animadíssimos, que seguiu em velocidade para dentro do bloco. Não adiantou ele gritar que não estava no bloco, esbravejar sua condição de não-folião, o trenzinho seguiu arrastando o coitado. Com muita dificuldade, o não-folião conseguiu finalmente dar uma guinada e se libertar do trenzinho, mas com a velocidade em que vinha, acabou sendo jogado em cima de três rapazes fortes, sem camisa, com o corpo cheio de purpurina, que o acolheram e o abraçaram. Ao ritmo da bateria, os três ficaram pulando abraçados ao não-folião que tentava explicar que só queria comprar um café da manhã. Assim que conseguiu sair do abraço coletivo, completamente purpurinado, ele tentou mais uma vez sair do bloco, mas deu de cara com uma moça que o agarrou, lhe tascou um beijo na boca e saiu sambando para a frente do bloco. Atordoado, o não-folião se aproximou de um vendedor para tentar comprar uma água, mas um sujeito fantasiado de bebê, com fralda e chupeta, lhe enfiou uma mamadeira na boca.

— Água enferruja! Bebe essa vodka que é de graça!

Depois de consumir a força quase meia mamadeira de vodka o não-folião conseguiu se livrar do bebezão. Meio zonzo, acabou caindo no chão. Uma moça muito bonitinha ficou com dó dele e o acudiu, levantou o rapaz e deu uma água de verdade para ele beber. Logo o namorado da moça, um brutamontes que estava procurando por ela desde a concentração do bloco a encontrou. E achou que o não-folião era a causa do sumiço da namorada. A mocinha muito bonitinha não deixava o namorado bater no não-folião, mas isso não durou muito tempo, pois logo um amigo do grandalhão ciumento, num ato de solidariedade masculina, soltou um direto na boca do não-folião que caiu estatelado no chão mais uma vez. Desta feita, quem o ajudou foi um senhor fantasiado de Carmen Miranda, que no intuito de estancar o sangue que saia do nariz do não-folião, tacou uma toalha em seu nariz. O não-folião ficou completamente tonto, mas conseguiu afastar a toalha do nariz e perguntou:

— O que tem nessa toalha? Álcool?

— É cheirinho da loló. Do bom!

Completamente zureta o não-folião conseguiu se levantar e afastar o Carmen Miranda que insistia em lhe dar mais cheirinho da loló. Apesar de completamente torto, o nao-folião conseguiu finalmente se arrastar de volta para casa.

Afora o celular que foi roubado no caminho, e a carteira que desapareceu de seu bolso, nada mais grave aconteceu e ele conseguiu voltar para casa. Procurou pelas chaves da portaria, que obviamente ficaram pelo caminho. Tocou o interfone, mas a mulherzinha não atendeu. Ele insistiu por mais uns dez minutos e nada. Quando já estava ficando preocupado, eis que surge a sua mulherzinha vindo de dentro do bloco. Ela parecia mais para lá do que pra cá, com as roupas amarfanhadas, o sutiã amarrado na cabeça e apenas um sapato no pé.

— Você estava demorando e eu fui atrás de você. — Ela disse.

Ele achou melhor não perguntar o que aconteceu com ela e ela também não perguntou nada a ele. Tomaram o café da manhã com o que tinham em casa. Passaram o dia assistindo seriados.